Rogério Gentile

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha, editor de Cotidiano e da coluna Painel e repórter especial.

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Sírio-Libanês é condenado a pedir desculpas por 'cenas de horror' em morte de criança

O hospital terá de pagar R$ 1,2 milhão de indenização por danos morais e pedir publicamente desculpas aos pais da criança

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A Justiça paulista condenou o Hospital Sírio-Libanês pela morte de uma criança de um ano de idade, que, de acordo com a decisão, faleceu após seis horas de intenso sofrimento, em meio a "cenas de horror", "sem a assistência médica adequada".

O hospital, de acordo com a decisão da juíza Thania Cardin, terá de pagar uma indenização por danos morais calculada em R$ 1,2 milhão, além de pedir publicamente desculpas aos pais da criança.

O hospital Sírio-Libanês, em São Paulo
O hospital Sírio-Libanês, em São Paulo - Sírio-Libanês/Reprodução

Pedro Assis Cândido foi internado no Sírio em março de 2018 para fazer um transplante de medula óssea, após ser diagnosticado como portador de uma doença chamada DGC (doença granulomatosa crônica). Trata-se de um distúrbio de origem genética que provoca uma disfunção nos fagócitos. As pessoas com essa doença não têm capacidade para combater bactérias e fungos.

O garoto recebeu uma dose de quimioterapia com o objetivo de destruir a medula doente e prepará-lo para receber a nova. No entanto, na sequência, de acordo com o processo, começou a demonstrar sinais de incômodo, que se transformaram em dores intensas, com choro incontrolável e gritos de desespero.

Os pais dizem que imploraram pela presença de um médico, mas que eles surgiram apenas quando houve uma parada cardiorrespiratória, horas depois. Mesmo assim, dizem, ele não foi transferido imediatamente para a UTI por "falta de vagas", recebendo duas doses de morfina. Posteriormente, sofreu outra parada cardiorrespiratória, falecendo na manhã seguinte.

"Absolutamente desnorteados, os pais, em profundo abatimento, receberam a notícia de óbito de seu filho, que poucas horas antes brincava alegremente", afirmou a defesa de T.C e S.C. "O hospital deixou de prestar socorro a uma criança cuja sobrevivência dependeria de uma avaliação médica e do seu encaminhamento à UTI."

Na decisão em que condenou o hospital, a juíza Thania Cardin disse que o Sírio-Libanês se omitiu quando tinha o dever de agir. "Nenhum médico, único profissional habilitado a ofertar tratamento, atendeu a criança pessoalmente das 19h30 do dia 06 de março até 02h30 do dia 07 de março", afirmou.

Além do hospital, foram condenados os médicos hematologistas Vanderson Rocha e Alessandra Gomes. O primeiro era o médico contratado pela família do garoto e coordenador da Unidade de Transplante de Medula Óssea do Sírio. A segunda era a médica responsável pelo acompanhamento da criança na noite dos fatos.

Segundo a magistrada, o que ocorreu foi uma "verdadeira cena de horror, tortura e menoscabo à dignidade e à vida do ser humano". O hospital, disse, foi negligente. A juíza, citando a perícia médica realizada, ressaltou que a bula do medicamento ministrado à criança "adverte sobre a necessidade de o paciente receber uma rigorosa supervisão medica".

Além da indenização por dano moral, os réus terão de restituir ao casal os valores gastos com despesas médicas, psicológicas e advocatícias.

No recurso apresentado e ainda não julgado pela Justiça, o hospital argumentou que a criança recebeu acompanhamento em tempo integral, ainda que não houvesse um médico ao seu lado durante a aplicação do medicamento. "Mas esse fato não implica em falha ou negligência", declarou à Justiça. "Não existia a necessidade da presença de um médico em tempo integral."

O Sírio, que questiona a perícia médica realizada, disse à Justiça que a bula do medicamento indica a necessidade de supervisão médica, que é "perfeitamente suprida pela equipe interdisciplinar, capaz de acompanhar a infusão, relatar e acionar um médico na hipótese de qualquer intercorrência".

Disse também que o paciente recebeu todo o atendimento necessário. "Não se pode afirmar, de nenhum modo, que houve demora que pudesse causar prejuízos ao atendimento do paciente, pois todos os atos e condutas foram praticados com a máxima celeridade", declarou.

O hospital afirmou que a morte do garoto foi causada por um sangramento oriundo de perfuração intestinal, "que é uma complicação típica da doença granulomatosa crônica."

Procurado pela coluna, o Sírio-Libanês disse, por meio de uma nota oficial, ser um "centro de excelência médica, reconhecido nacionalmente e fora do país".

Disse que a instituição sempre trabalhou adotando os mais rigorosos protocolos técnico-científicos e que recebeu certificações que referendam sua atuação centenária.

"O caso referido segue em tramitação na Justiça e, por isso, a instituição não pode comentar sobre seu andamento."

Os médicos Vanderson Rocha e Alessandra Gomes também recorreram da decisão. Eles dizem que o óbito não teve nenhuma relação com os atendimentos prestados no hospital.

De acordo com eles, o paciente "era portador de doença grave, de alto risco de mortalidade e vinha passando por diversos episódios de complicações, apesar de apresentar esporadicamente quadros de estabilidade".

Os médicos dizem que os pais "foram exaustivamente advertidos sobre os riscos compreendidos no tratamento do paciente, inclusive sobre a possibilidade de óbito".

"Apesar de todo o esforço da equipe médica e do hospital, os riscos não puderam ser superados, culminando no óbito do paciente por razões que fogem à ingerência dos réus", afirmou a defesa dos médicos à Justiça.

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