Desde o primeiro emprego até a hora de se aposentar, os principais fatos da linha do tempo do trabalhador convergem para um dos maiores big data do país, o Cnis (Cadastro Nacional de Informações Sociais). São mais de 29,3 bilhões de registros cadastrais inseridos mensalmente, a exemplo do endereço, telefone, salário, doença, desemprego, prisão, empréstimos e configuração familiar.
O INSS (Instituto Nacional do Seguro Social) é o principal destinatário desse acervo. Ele precisa saber das minúcias da vida de cada segurado, para se posicionar sobre a concessão dos benefícios. No entanto, não está tendo a responsabilidade de manter entre quatro paredes os dados que lhe são confiados.
Os dados são atualizados no sistema periodicamente e são vazados na mesma intensidade. Dia após dia se renovam as queixas de novos aposentados sendo assediados pelo marketing ativo de bancos, que oferecem empréstimo ou por advogados que compram a lista de benefícios negados para insinuar seus serviços, em ambos os casos sem qualquer consentimento dos titulares.
Alguém poderia pensar que um simples "não" seria o suficiente para estancar as investidas, ainda que isso custe elevada dose de paciência para conter a insistência mercadológica de quem comprou os dados.
Afinal, ninguém é obrigado a contratar serviço não desejado. O problema é que, uma vez existindo o comércio ilegal, não se tem mais controle de onde isso vai parar.
Dados pessoais e sensíveis podem cair nas mãos de estelionatários, para o cometimento de infindáveis, criativos e cíclicos golpes. Esse banquete de informações é disponibilizado aos cerca de 23 mil servidores públicos do INSS que precisam trabalhar com eles. E bastaria o deslize de um para tornar inócua toda a segurança de dados e de investimentos em infraestrutura tecnológica previdenciária.
O compartilhamento de informações pessoais sem a anuência expressa do interessado é prática ilegal, coibida sobretudo na LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados).
Desde 2016, a situação já entrou no radar do Ministério Público Federal, que acionou o órgão previdenciário na Justiça para ter maior responsabilidade no controle do seu banco de dados.
O instituto coleciona condenações judiciais em processos coletivos e individuais. Foram inúteis. Todo mês renova-se a lista de reclamação de pessoas que são importunadas em razão dos dados roubados.
Por meio de seus prepostos, o INSS viola continuamente esse direito fundamental à privacidade. Tem gente ganhando muito dinheiro com isso. É preciso encontrar os que estão enriquecendo com tal prática, puni-los rigorosamente e definir qual solução tecnológica-legal pode ser adotada para colocar um ponto final no comércio ilegal dos dados previdenciários.
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