Ronaldo Lemos

Advogado, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro.

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Ronaldo Lemos

Como lidar com extremismo online?

Violência online não fica só online, mas produz efeitos diretos sobre a realidade

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Uma das consequências dos dois ataques de atiradores nos Estados Unidos nos últimos dias é a tentativa de banimento da internet do site 8Chan

O site funciona como um fórum anônimo online, uma espécie de “paraíso da liberdade de expressão”. Por causa disso, tornou-se um dos pontos de encontro para extremistas, terroristas e perpetradores de várias das tragédias dos últimos meses (do massacre na Nova Zelândia e agora de El Paso).

Com as mortes dos últimos dias, muitas empresas de internet decretaram um “basta!” para o serviço e resolveram agir por conta própria para impedir que o 8Chan continuasse no ar. Por exemplo, a Cloudfare —que oferece proteção a ataques de negação de serviço— deixou de atuar para o site, fazendo com que ele rapidamente não conseguisse se manter no ar.


A medida logo levantou discussões. “Em que medida empresas privadas podem se arrogar o direito de decidir se um site permanece no ar ou não?”, gritou boa parte dos membros do 8Chan. Já o fundador do site —que se arrependeu de sua criação e desvinculou-se dele em 2015— apoiou a medida.

Tudo isso demonstra que o modelo de liberdade de expressão forjado nos anos 1950, 1960 e 1970 com o advento da TV está sendo profundamente revisado. A remoção de um site da rede é medida extrema, reservada para casos-limite. A medida é chamada de “deplatform”, algo como “desplataformar”, literalmente remover os muitos alicerces que permitem a um site funcionar.

No passado já houve usos questionáveis desse tipo de medida. Por exemplo, o governo da Líbia tentou encerrar o endereço de sites com textos de cunho sexual do jornal San Francisco Chronicle. O leitor pode se perguntar como a Líbia poderia fazer isso. E a resposta é curiosa: a Líbia administra todos os domínios terminados com o “.ly”, como é o caso de encurtadores de endereços como o “bit.ly”. 

Em outro caso o canal de TV Al-Jazeera também foi “desplataformado” por provedores de acesso nos EUA quando Dick Cheney vinculou a rede aos atentados do 11 de Setembro.

Se a prática de “desplataformar” é controversa, qual seria a alternativa então? O fato é que o modelo de Estado hoje é praticamente impotente com relação a casos como o do 8Chan. Sozinho, um país dificilmente consegue fazer qualquer coisa eficaz para remediar a propagação de conteúdo extremista.

Isso ficou claro com os anos de uso da internet pelo chamado Estado Islâmico, sem que se conseguisse fazer nada contra.

Nesse contexto, para onde estamos indo? Há soluções em vista. Primeiramente, o modelo do multissetorialismo, em que o Estado, a sociedade civil, a comunidade científica e o setor privado se unem para tratar conjuntamente de casos como esse nunca foi tão importante. Esse é um caminho promissor.

Outros caminhos incluem propostas como a do professor de Harvard Jonathan Zittrain, que acredita que devemos enxergar a questão de liberdade de expressão também como uma questão de saúde pública.

Estaríamos assim entrando em uma terceira era da liberdade de expressão, em que novos modelos de devido processo legal são construídos para lidar com a questão do extremismo online. 

O que o 8Chan e o Estado Islâmico têm em comum é demonstrar que a violência online não fica só online, mas produz efeitos diretos sobre a realidade.
 

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Já era
Achar que trabalho doméstico não é trabalho.

Já é
Usar planilhas para administrar a casa.

Já vem
Famílias que usam apps de administração de empresas (como Trello, Slack etc.) para administrar a casa.

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