Ronaldo Lemos

Advogado, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro.

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Ronaldo Lemos
Descrição de chapéu Folhajus tecnologia

O Estado tem um papel na inovação?

Faz sentido o Brasil abrir mão de fabricar chips quando esse mercado está aquecido?

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Uma das crises mais impressionantes dos tempos atuais é a escassez de microchips para a fabricação de equipamentos eletrônicos, computadores, celulares e mais. Essa crise deriva principalmente da batalha entre Estados Unidos e China em torno do avanço tecnológico.

No ano passado, os EUA baniram a Huawei e outras empresas chinesas de terem acesso a qualquer chip fabricado com equipamento ou propriedade intelectual americana.

O resultado dessa política foi um frenesi por parte das empresas chinesas adquirindo e estocando chips agressivamente, enquanto ganham tempo para desenvolver seu próprio parque industrial capaz de fabricar de forma autônoma esses componentes.

Trabalhadores na empresa japonesa de chips Renesas Electronics - Kazuhiro Nogi / AFP

Essa briga tem tido desdobramentos inusitados. Por exemplo, o governo de Boris Johnson decidiu há poucos dias interromper a aquisição da gigantesca empresa de chips inglesa Arm pela americana Nvidia.

A história da Arm é incrível.

A empresa surgiu na cidade de Cambridge puxada por um esforço da BBC de promover educação digital nos anos 80. Esse esforço não só formou um contingente enorme de pessoas capazes de trabalhar com tecnologia, como criou um computador doméstico estatal de enorme sucesso na época, o BBC Micro, com chips fabricados pela empresa.

Esse primeiro esforço levou a inovações maiores. Na sequência a Arm desenhou o revolucionário chip Risc. A arquitetura desse chip está hoje presente nos componentes de praticamente todos os smartphones. Vale dizer que foi desenhada por Sophie Wilson, cientista da computação transgênero —pouco lembrada— que literalmente criou as bases para o mundo contemporâneo.

A Arm é hoje a joia da coroa do mundo dos chips. Isso porque especializou-se em desenhar chips, que são então fabricados por empresas no mundo todo. O governo de Boris Johnson —eminentemente liberal— não só impediu a aquisição pela Nvidia como está considerando uma possível aquisição estatal da empresa, isto é, reestatizá-la.

Esse movimento da Inglaterra, que simboliza estados nacionais entrando pesado em investimentos em inovação, virou tendência. A China já vinha colhendo sucesso atrás de sucesso derivado dos seus planos nacionais de desenvolvimento tecnológico, visíveis no Tik Tok ou no Clubhouse.

Os EUA agora entraram pesado no mesmo jogo. O plano do presidente Joe Biden vai na mesma linha, prevendo investimentos estatais massivos em tecnologia e inovação. É como se além dos esforços do GovTech (do uso da tecnologia por governos) o mundo esteja caminhando para um TechGov, a promoção massiva de tecnologias por governos, como aconteceu nos anos 1980.

Já no Brasil a notícia é em sentido diametralmente oposto. O governo federal decidiu simplesmente liquidar a Cietec, estatal que é a única empresa de chips do país e de toda a América Latina.

Faz sentido o Brasil abrir mão totalmente de fabricar chips quando esse mercado está enormemente aquecido? Faz sentido abrirmos mão do know-how e da logística desenvolvida pela Cietec? Faz sentido abdicarmos de uma planta fabril capaz de ser embrião para saltos maiores, como outras empresas como a Arm fizeram no passado?

Espero realmente que essas perguntas tenham sido feitas antes de se decidir pela liquidação da única empresa de chips do país.

Reader

Já era estado 100% analógico

Já é GovTech

Já vem TechGov

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