Ronaldo Lemos

Advogado, diretor do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro.

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Lei de Proteção de Dados está sendo usada contra transparência

LGPD tornou-se a ferramenta preferida dos gestores que querem ocultar suas atividades

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Pouco antes de morrer, o grande jornalista e então diretor da organização Transparência Brasil, Claudio Weber Abramo, escreveu um artigo seminal na Folha chamado "Risco de Retrocesso na Proteção de Dados Pessoais".

Abramo foi pioneiro na prática do chamado "jornalismo de dados" no Brasil. Ele acreditava, com razão, que o futuro do jornalismo passava pela análise detalhada dos dados produzidos pela administração pública. Há até um prêmio para essa prática, que hoje leva seu nome.

Seu medo era que a LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados), aprovada também em 2018, pudesse desconstruir todo o esforço feito ao longo de anos para promover a transparência no setor público.

teste
teste - Mal Langsdon/Reuters

O temor de Abramo, infelizmente, se concretizou. Atualmente, a LGPD tornou-se a ferramenta preferida dos gestores que querem ocultar suas atividades, promover retrocessos e suprimir o acesso a dados que são públicos, necessários para a realização de políticas públicas, ou de fundamento constitucional.

Por exemplo, na semana passada, o Ministério da Educação pela primeira vez passou a suprimir a divulgação de vários dados essenciais do Enem, justamente aqueles que nos últimos anos vinham permitindo a realização de várias políticas educacionais eficazes no país.

Já a Presidência chegou a negar o acesso a informações sobre a agenda de visitantes do Palácio do Planalto. E, mais recentemente, houve debate sobre proibir a divulgação de dados de doadores eleitorais e de pessoas que prestam serviços para companhas políticas.

Qual foi a justificativa para todos esses casos? A LGPD. Essa justificativa, diga-se, é incorreta e perversa. A LGPD não foi criada para e nem tem o efeito de suprimir a divulgação de dados públicos. Ao contrário, a própria lei reconhece a realização de políticas públicas como uma de suas exceções. Nem poderia ser diferente.

A LGDP deve ser sempre utilizada em sintonia com a Constituição e outras leis. Mais do que isso, há uma confusão conceitual entre sigilo e proteção de dados. A proteção de dados não serve para impedir sua utilização (é exatamente o contrário), o sigilo sim.

O Brasil por muito tempo viveu no obscurantismo com relação à administração pública. Foi só a partir de 2011 que aconteceu uma virada notável. O país fundou internacionalmente a chamada Parceria do Governo Aberto (Open Government Partnership), iniciativa que rapidamente obteve a adesão de 78 países, incluindo os Estados Unidos. Seu objetivo foi gerar compromissos de reforma legal e administrativa entre os membros para promover transparência no setor público e o acesso crescente a dados desse setor.

Foi na esteira dessa iniciativa que o Brasil, em novembro de 2011, aprovou tardiamente sua Lei de Acesso à Informação. O México, por exemplo, já tinha uma lei dessa natureza desde 2003. Tudo isso está hoje sob ataque por causa dessa aplicação perversa da LGPD.

Não só Claudio Abramo tinha razão como enxergou o futuro. Em 2018, escreveu: "As consequências da omissão [de dados] não serão triviais. Informações que, a duras penas, passaram a ser divulgadas devido a iniciativas de transparência ativa, estimuladas por políticas de acesso à informação, deixarão de sê-lo, pretextando-se ‘defesa da privacidade’’’.


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Já era Trabalhar para a Lei Geral de Proteção de Dados ser aprovada

Já é Trabalhar para a LGPD ser aplicada

Já vem Trabalhar para a LGPD não ser aplicada para suprimir acesso a dados públicos

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