O Brasil tem um novo presidente. Ele terá a oportunidade de iniciar o processo de recuperação do tempo perdido com relação à agenda tecnológica do país. Só para recapitular, de 1992 a 2014 o Brasil desempenhou um papel de liderança global na área de governança tecnológica.
Esse papel começou com a Eco 92 no Rio de Janeiro, quando o Brasil ofereceu endereços de email para todos os delegados internacionais que vieram ao país para a primeira conferência do clima. Algo na época surpreendente e raro. A maioria deles nunca tinha usado email à época.
De lá para cá foram muitos feitos do Brasil na área. A criação do Comitê Gestor da Internet, com caráter multissetorial. A criação do Marco Civil da Internet. O protagonismo do país na Organização Mundial da Propriedade Intelectual, sob a liderança de Gilberto Gil. A criação pelo Brasil e pela Argentina da Parceria para Governo Aberto, com adesão dos EUA, e assim por diante.
A liderança brasileira encerrou-se com a organização da conferência internacional NetMundial em 2014 no Rio de Janeiro. O mundo atendeu ao chamado do país para discutir o futuro da internet, incluindo China, Rússia, EUA, Europa, países latinos e africanos. Esse foi o canto do cisne do protagonismo do país em governança tecnológica. Morreu bonito, mas morreu.
Desde então o país deixou de ter relevância e agenda nesse campo. Em vez de líder, viramos liderados. Ficamos a reboque de qualquer coisa que surgia nessa área, sendo atingidos passivamente por suas consequências, muitas vezes nefastas. Haja vista o fenômeno das fake news e do comportamento inautêntico coordenado na internet, que fraturou, inflamou e convulsionou o país. Aceitamos tudo como fatos da natureza, sem qualquer visão crítica ou atuação sobre suas causas estruturais. Em outras palavras, fomos vítimas. Do tipo alienado e indefeso.
Agora o país tem a chance de sacudir a poeira e dar a volta por cima. Assumir um posicionamento altivo e soberano com relação à tecnologia, como já aconteceu antes. Afinal, não existe país que seja capaz de se desenvolver sem definir claramente o que quer fazer com relação à tecnologia.
Como ela é hoje requisito para participar da economia do conhecimento, a postura do país sobre a tecnologia vai definir se continuaremos a viver majoritariamente da natureza ou se seremos capazes de começar a viver de ideias, sejam elas grandes e complexas, ou simples e espontâneas.
Na próxima semana vou listar o que na minha opinião são os principais eixos que devem constar da nova agenda tecnológica do país. Para quem se frustrou de não encontrá-los já nesse texto, deixo alguns spoilers: trata-se de uma agenda muito mais propositiva do que reativa. Está na hora de o país construir um plano de onde quer chegar. E seguir esse plano. Parafraseando o brilhante economista guineense, Carlos Lopes, os países em desenvolvimento bem-sucedidos são aqueles que possuem muito poucas prioridades. As nossas passam por identificar áreas em que já somos competitivos, capacidades que já se encontram instaladas e aplicar camadas de competitividade sobre elas. Além disso, retomar o protagonismo internacional para que nunca de novo sejamos vítimas indefesas da tecnologia como fomos nos últimos anos. E por fim, estabelecer uma política nacional de dados, a maior riqueza que o país tem a seu favor para se desenvolver tecnologicamente. Chega de spoilers. Até semana que vem.
READER
Já era Brasil como liderança global na área de governança tecnológica
Já é Brasil completamente subjugado e sucateado na área de governança tecnológica
Já vem Chance de o Brasil retomar seu protagonismo global em políticas tecnológicas
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