Ruy Castro

Jornalista e escritor, autor das biografias de Carmen Miranda, Garrincha e Nelson Rodrigues, é membro da Academia Brasileira de Letras.

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Ruy Castro

Arqueologia da bossa nova

O endereço histórico, onde tudo realmente começou

Nós, jornalistas, já começamos a lamber as pontas dos lápis para o próximo dia 10 de julho. Nele se completarão 60 anos que João Gilberto gravou o 78 r.p.m. da Odeon, com “Chega de Saudade”, de um lado, e “Bim-Bom”, do outro. Foi o disco que inaugurou a bossa nova. Parte da imprensa escreverá que, apesar dos 60, a bossa nova conserva um corpinho de 30. Outra talvez prefira desancá-la, acusando-a de não ter “evoluído”. Os estrangeiros, por sua vez, nos dirão de sua gratidão ao Brasil por ter inventado a bossa nova. 

A bossa nova inspira peregrinações por seus lugares históricos, como a rua Nascimento Silva, em Ipanema, onde morou Tom Jobim, ou a esquina de avenida Atlântica com rua Constante Ramos, onde ficava o apartamento de Nara Leão. Vai-se ao Villarino, onde Tom e Vinicius firmaram sua parceria, e ao antigo Veloso, hoje Garota de Ipanema, onde a dupla viu a garota passar. A noite do Beco das Garrafas tem de volta o Bottles e o Little Club, e, agora, durante o dia, a Bossa Nova & Companhia, a loja dos sonhos dos fãs da bossa nova.

Um endereço básico dessa peregrinação deveria ser o edifício São Borja, na avenida Rio Branco, 277, em frente à Cinelândia. Era ali, no quarto andar, que ficava o estúdio da Odeon onde João Gilberto gravou o 78 —e não só este, mas também as demais faixas que comporiam o LP “Chega de Saudade”, de 1959, e os outros dois LPs, “O Amor, o Sorriso e a Flor”, de 1960, e “João Gilberto”, de 1961, bíblias da bossa nova. 

A bossa nova era quase toda da Odeon. Daquele estúdio saíram os discos de Sylvia Telles, Luiz Bonfá, Lucio Alves, Norma Bengell, Leny Andrade, Pery Ribeiro, Marcos Valle, que deram corpo e alma à nova música.

A Odeon se mudou há muito do São Borja e não sei o que funciona atualmente no quarto andar. Mas, se eu subir até este “por engano”, ouvirei os ecos do que aconteceu ali naquele 10 de julho de 60 anos atrás.

 
Compacto com 'Chega de Saudade', de João Gilberto
Compacto com 'Chega de Saudade', de João Gilberto - Rafael Andrade/Folhapress
Tópicos relacionados

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.