Ruy Castro

Jornalista e escritor, autor das biografias de Carmen Miranda, Garrincha e Nelson Rodrigues, é membro da Academia Brasileira de Letras.

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Ruy Castro

A morte da livraria

A Cultura não teve tempo para se firmar entre as grandes do Rio

Fachada art déco do antigo cinema Vitória, convertido na Livraria Cultura
Fachada art déco do antigo cinema Vitória, convertido na Livraria Cultura - Divulgação

A megafilial carioca da Livraria Cultura fechou as portas. Ficava na Cinelândia e ocupava o prédio do antigo Cinema Vitória, uma das maravilhas do art déco no Rio, inaugurado em 1942 com “O Grande Ditador”, de Chaplin. Assisti a grandes filmes no Vitória. Nos anos 80, com a decadência dos cinemas de rua, o proprietário dedicou-se a degradá-lo, reduzindo-o a filmes pornô, até finalmente fechá-lo. Sua transformação na Cultura em 2012, mantidos muitos traços originais do prédio, era a esperança de sua conservação.

As livrarias sempre foram pontos de encontro entre os escritores e seus leitores, para benefício de ambos. No Rio, a primeira foi a do editor e tipógrafo Paula Brito, na hoje praça Tiradentes, pouso em 1860 de Joaquim Manuel de Macedo, Manuel Antonio de Almeida e Machado de Assis. Sucedeu-a, rumo a 1900, o longo reinado da Garnier, na rua do Ouvidor, também com Machado, mas já na companhia da turma de Coelho Netto e Olavo Bilac.

Veio então a Leite Ribeiro, no largo da Carioca, com suas vitrines iluminadas e onde Théo-Filho e Gilka Machado davam as ordens em 1922. Nos anos 30 e 40, a José Olympio, também na Ouvidor, era o território de Zé Lins do Rego e Graciliano Ramos. Em seguida, a querida São José, na rua idem, onde Drummond batia o ponto todos os dias. E a Leonardo da Vinci, reduto em 1968 dos cientistas sociais, dos estruturalistas e dos leitores do Cahiers du Cinéma. 

De 1990 para cá, diversas livrarias foram palco de encontros: a Timbre, até hoje no Shopping da Gávea; sua pranteada vizinha, a Bookmakers; a Dantes, no Leblon, também morta; e as várias Travessas, cada vez mais acolhedoras e, graças, firmes. 

A crise e outros problemas não deram tempo à Cultura para criar aquele ambiente mágico em que autores e leitores se espelham —estes, sonhando escrever, e, aqueles, ansiando pelo dia em que poderão se dedicar simplesmente a ler.

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