Ruy Castro

Jornalista e escritor, autor das biografias de Carmen Miranda, Garrincha e Nelson Rodrigues, é membro da Academia Brasileira de Letras.

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Ruy Castro

A música dos outros

Charles Aznavour não foi o Sinatra francês. Foi Aznavour, e isso bastava

Charles Aznavour tinha seu próprio cancioneiro para cantar.
Charles Aznavour tinha seu próprio cancioneiro para cantar - Divulgação

Quando Charles Aznavour morreu, no dia 1º último, os jornais, para dar uma medida de sua importância na cena musical, o chamaram de “o Frank Sinatra francês”.

Todo país tem ou já teve um “Sinatra”. Mas, quando se examina o que é preciso para justificar o epíteto, descobre-se que não basta ter sido um cantor rico, longevo e poderoso como Sinatra. É preciso muito mais. 

Exemplos. Sinatra, em 50 anos de carreira, gravou o creme do cancioneiro americano —ponha aí mais de mil canções. E fez isto, não uma nem duas, mas três vezes, na Columbia, na Capitol e na Reprise —sempre que trocava de gravadora, fazia questão de regravar os clássicos, os standards. Aliás, e por isso mesmo, o conceito de standard lhe deve mais do que a qualquer outro. Foi também o cantor que mais ajudou a estabelecer a importância de compositores como Cole Porter, Harold Arlen, Matt Dennis, Frank Loesser, as parcerias Rodgers e Hart, Rodgers e Hammerstein e Jimmy Van Heusen e Sammy Cahn, e consagrou novatos como Cy Coleman e Carolyn Leigh (“Witchcraft”), Bart Howard (“Fly me to the Moon”) e até Stephen Sondheim (“Send in the Clowns”).

Aznavour foi um fabuloso intérprete. Mas não gravou o cancioneiro francês. Gravou apenas seu cancioneiro. Compôs cerca de 1.300 canções, as quais formavam seu repertório. Não teve muito tempo para se dedicar à música dos outros. Aliás, essa é uma característica bem francesa: seus grandes nomes masculinos, como Charles Trenet, Léo Ferré, Georges Brassens, Jacques Brel, Gilbert Bécaud, Serge Gainsbourg, só cantavam as próprias músicas e letras. Os mais próximos de cantores puros seriam Maurice Chevalier, Jean Sablon, Yves Montand. 

Só se conhece uma canção assinada por Sinatra: “This Love of Mine”, de 1941, em parceria com Hank Sanicola e Sol Parker. Mas era só deste último. Sanicola, amigo dos amigos, “convenceu” Parker a lhes dar parceria.  

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