O título de capital mundial da arquitetura conferido ao Rio na semana retrasada pela Unesco não se limita ao fato de que a cidade sediará em 2020 um congresso internacional sobre o assunto.
É o reconhecimento de que o Rio está entre as cidades em que, ao se dobrar uma esquina, pode-se recuar 300 ou 400 anos no tempo. E o que antes parecia um defeito —estilos arquitetônicos que se sucederam sem que os anteriores fossem apagados— hoje é uma virtude. O presente e o futuro de uma cidade se fazem com seus muitos passados.
Mesmo com os abandonos, devastações e rombos de que continua a ser vítima, o Rio ainda é uma festa no tempo. Quando Joaquim Manoel de Macedo publicou “Memórias da Rua do Ouvidor”, em 1878, a rua do Ouvidor, aberta em 1578 como Desvio do Mar, já tinha 300 anos. Também do século 16 são a praça 15 e as ruas Primeiro de Março e Santa Luzia. Do século 17, as ruas da Conceição, Quitanda e São José, as praças Tiradentes e República. Do século 18, o Arco do Telles, a avenida Marechal Floriano, o Passeio Público, os Arcos da Lapa, a rua do Lavradio e toda a Lapa e Santa Teresa. O século 19 é covardia. As zonas norte e portuária foram urbanizadas, assim como o Flamengo, Botafogo, Laranjeiras, a Gávea e o Jardim Botânico, deixando Copacabana, Ipanema e Leblon para o século 20.
Muitas das ruas citadas foram abertas com outros nomes, claro, e estão bastante transformadas. Mas a maioria mantém o espírito original e, às vezes, fileiras inteiras de construções da época. Em cada uma, há amostras dos estilos arquitetônicos com que nasceram: o colonial, o neoclássico, o eclético, o neocolonial, o art déco, o moderno e o contemporâneo. Dos Arcos ao Cristo e ao Museu do Amanhã, os 20 mil delegados do congresso terão muito que ver.
Pena que, nesse período, o Rio ainda estará sob o descomando de Marcelo Crivella, seu pior administrador em 453 anos.
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