A notícia sobre o incêndio nos depósitos da gravadora Universal, em Hollywood, em 2008, e cuja dimensão só se soube agora, ainda não repercutiu à altura. Nele perderam-se os masters de metal e as fitas magnéticas de 70% da música americana gravada a partir de 1925 e que estava em poder da Universal. A lista de artistas com originais incinerados abrange milhares. Salvaram-se os que pertenciam à Victor, como Caruso, Glenn Miller e Elvis Presley, hoje em poder da Sony, e os sob o domínio da Warner, o que inclui Ray Charles quase completo, a segunda metade da carreira de Frank Sinatra e muito rock dos anos 50 a 70. Tudo o mais, produzido originalmente por inúmeros selos, se perdeu.
Imagine se museus como o Metropolitan, de Nova York, o British Museum, de Londres, o Hermitage, de São Petersburgo, e os do Vaticano, em Roma, tivessem suas coleções transferidas para o Louvre, em Paris, e o Louvre queimasse. Foi parecido. Dezenas de selos de jazz e de música popular dos anos 20, 30 e 40 tiveram seus masters comprados nos anos 50, 60 e 70 pelos selos maiores; estes foram se fundindo uns com os outros nos anos 80, 90 e 00, e alguns ficaram gigantes; a Universal, que era um destes, abocanhou os demais gigantes, ficou com tudo —e deixou queimar.
Eis apenas alguns selos e seus artistas históricos cujos originais estavam sob a guarda da Universal: a Okeh de Louis Armstrong, a Columbia de Billie Holiday e Miles Davis, a Decca de Al Jolson e Bing Crosby, a Capitol de Nat King Cole e Sinatra, a Savoy de Charlie Parker, a Pacific de Gerry Mulligan e Chet Baker, a Verve dos songbooks de Ella Fitzgerald e do “Getz/Gilberto”, a Impulse de John Coltrane, a A&M de Tom Jobim e Sérgio Mendes.
“E daí?”, dirá você. “Já está tudo digitalizado.” Sim. Mas imagine a “Mona Lisa” desaparecer e só restar uma cópia digitalizada.
Ou imagine você próprio, apenas digitalizado.
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