Há três meses, na morte de João Gilberto, fiquei na expectativa de que pelo menos uma das gravadoras para as quais ele trabalhou manifestasse seu pesar pela perda de um grande artista. Não esperava que essas gravadoras se juntassem e rateassem seus milhões para publicar anúncios de página inteira nos principais jornais do país. Um simples tijolinho, associando-se à convocação da família para uma missa de 7º dia, já seria suficiente. Mas nenhuma se deu nem a tal respeito.
Essas gravadoras são as gigantes Universal, Sony e Warner. Elas representam 90% da indústria fonográfica mundial. Seus discos com João Gilberto não são apenas alguns dos maiores já produzidos na história da música popular. São também atrações fixas de seus catálogos, nunca tirados de circulação. A Warner é a detentora, entre outros, de “Amoroso”; a Sony, de vários discos ao vivo; e a Universal, dos insuperáveis “Getz/Gilberto”, “João Gilberto en México” e do disco branco de 1973. Todos são reprensados, ano após ano, e lhes rendem muito dinheiro em toda parte.
Em toda parte —menos no Brasil. O artista que deveria ter sua obra completa disponível em todas as mídias está ausente das lojas justamente no país de cuja música ele representou, com um único disco, em 1958, o antes e o depois.
Uma das explicações é a de que a maior parte de sua produção está concentrada na Universal, de cujo leque faz parte agora a histórica Odeon, com a qual João Gilberto estabeleceu um litígio judicial que se arrasta há décadas. Por causa disso, a Universal estaria condenando ao silêncio os discos que gravou com ele em seus antigos selos Philips, Polydor e PolyGram. Mas o que explica que as outras gravadoras também nos neguem o que oferecem ao mundo?
Não se sabe por quem mais lamentar esse silêncio —se pelo legado do artista João Gilberto ou se pelos brasileiros cujas vidas ele poderia continuar a transformar com sua música.
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