Ruy Castro

Jornalista e escritor, autor das biografias de Carmen Miranda, Garrincha e Nelson Rodrigues, é membro da Academia Brasileira de Letras.

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Ruy Castro
Descrição de chapéu internet tecnologia

Mensagem na garrafa

Os emails caem hoje num buraco negro e só são abertos uma semana depois —quando são

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Há quatro ou cinco anos, ao ditar meu email para um amigo, ele engasgou ao saber que eu ainda usava o servidor Terra. “Terra???”, perguntou, como se isso equivalesse a escrever uma mensagem, enfiá-la numa garrafa e atirá-la ao mar. Na minha inocência digital, tentei me justificar: “Qual é o problema? Eu também moro até hoje no planeta Terra!”. Ele não se convenceu. Eu estava atrasado, tinha de aderir ao gmail. Ignorei seu conselho, mas logo percebi que, realmente, todo mundo tinha se convertido ao gmail. Eu devia ser o último Terra na —sem trocadilho— Terra.

Nos anos seguintes, isso não me alterou a vida, o que atribuo à misericórdia dos amigos ou por eles acharem excitante escrever para um email oriundo do Cro-Magnon. O fato é que, apesar do descompasso tecnológico, o fluxo Terra-gmail e vice-versa continuou ativo nesse período. Através dele, enviei e recebi milhares de textos, fotos e vídeos, como um internauta normal.

Não mais. Tenho observado que, exceto pelos contatos com a Folha e com a Companhia das Letras —por razões profissionais, claro—, meu email passa dias agora sem receber uma mensagem. Pior: os emails que envio devem cair num buraco negro ou só são lidos e respondidos uma semana depois. E não por uma aversão particular ao Terra, mas porque cada vez menos gente usa email —inclusive o fabuloso gmail.

Ou seja, se tivesse ouvido o meu amigo e trocado o Terra pelo gmail, eu estaria me sentindo agora, do mesmo jeito, um Robinson Crusoé sem radinho de pilha, como diria o Nelson Rodrigues —tão
isolado quanto.

Como um dia já escrevi aqui, o jeito que encontrei para manter a sanidade foi me manter pelo menos dez anos atrasado em relação à tecnologia. E, até há pouco, vinha dando certo. Mas a tecnologia não quer saber. Insensível, ela vai em frente e nos obriga, a nós, os recalcitrantes, a apelar para a mensagem na garrafa.

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