No domingo (1°/8), ao falar de como, no passado, sucessos da música internacional ganhavam versões em português, ouvi de um amigo que elas eram “transcriações” —seus letristas não traduziam só o significado, mas, às vezes, também o signo. E exemplificou com duas versões que eu citara: a de “All of Me”, em que, num verso, Haroldo Barbosa converteu o título em “Ai de Mim”, e de “Edmundo”, que foi como “In the Mood” soou para Aloysio de Oliveira.
Antes que o papo derivasse perigosamente para a estrutura verbivocovisual do ideograma chinês, aleguei que o assunto era samba e que Aloysio não devia saber o que era semiótica. Nem precisava —ou não teria transformado “On The Sunny Side of the Street”, de Jimmy McHugh e Dorothy Fields, em “A Sobrinha da Judite”: “Ninguém pode lá morar/ Não é rua que se habite/ Se puder evite/ Ir no sunny side of the street.//É uma coisa de amargar/ De perder o apetite/ Se puder evite/ Ir no sunny side of the street”.
Aloysio adaptou “Chattanooga Choo-Choo”, de Harry Warren e Mack Gordon, para Carmen Miranda: “Vou explicar/ O que é o Chattanoga Choo-Choo/ Choo-choo é um trem/ Que vai me levar para alguém// [...]/ Você pega o trem na Pennsylvania Station/ Às três horas e tal/ Pouco a pouco vai saindo da capital/ Toma um cafezinho, tira uma pestana/ E come um ham and eggs lá na Carolâina...”.
Quando queria, ele podia ser romântico. Mas sem perder o humor, como em “Sem Cessar”, nascido “All the Way”, de Jimmy Van Heusen e Sammy Cahn: “Se alguém te ama/ Não é bom se não te ama/ All the way...”.
Ou em “These Foolish Things”, de Jack Strachey e Holt Marvell, que se tornou “Coisas que Lembram Você”: “Um lenço branco de batom marcado/ Um telefone que só toca ao lado/ Tudo isso eu guardo porque/ Coisas assim me lembram você.// Uma canção que traz você mais perto/ A voz macia do João Gilberto/ Tudo isso eu guardo porque/ Coisas assim me lembram você”.
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