Para Jair Bolsonaro, neste momento, a pior forma de solidão deve ser a companhia dele mesmo. Encerrado seu sketch cômico no Alvorada contra as urnas eletrônicas, viu que estava falando sozinho. Nenhum dos embaixadores o aplaudiu e, ao sair dali, todos alertaram seus governos para a possibilidade de uma versão roceira da arruaça de Donald Trump em 6 de janeiro de 2021. Habituado a governar no tapa, Bolsonaro pode ter sentido a mão se voltar contra a sua própria face.
Nas 48 horas seguintes, o Departamento de Estado dos EUA, escolado em trumpices, declarou que as eleições brasileiras são um modelo para o hemisfério e o mundo. A mídia internacional repudiou em massa a encenação e organismos da área econômica insinuaram que uma aventura, de inspiração óbvia e desfecho conhecido, não fará bem aos negócios do Brasil.
Mas a pior goleada é a que Bolsonaro está levando ao ser desautorizado por presuntivos aliados. Juízes, promotores, Polícia Federal, procuradores da República, ministros do TCU, servidores da Abin, o presidente do STF Luiz Fux e até o anfíbio presidente do Senado Rodrigo Pacheco. Todos defenderam o sistema brasileiro de votação. Os milhares de candidatos aos diversos cargos em outubro sabem que, se Bolsonaro melar a eleição, a deles também escorrerá pelo buraco. E, por fim, militares da ativa, talvez cansados dos contorcionismos a que são obrigados pelo bufão, mandaram dizer ao STF que acreditam na lisura das eleições. O que mais falta para um desembarque geral da canoa de Bolsonaro?
Mas suponha o seguinte. Isolado, sabendo-se desde já derrotado e sujeito a ver o sol nascer quadrado, sua fala para os embaixadores terá sido uma carta decisiva. Os crimes embutidos nela o levariam de propósito a um processo que o impediria de concorrer —senha para a súcia tirar os canos do armário e sair à rua para matar (ou morrer) por ele.
Eu disse que era uma suposição.
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