Samuel Pessôa

Pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) e da Julius Baer Family Office (JBFO). É doutor em economia pela USP.

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Samuel Pessôa

Estamos em uma economia de guerra

Todos terão que compartilhar parte da queda da renda

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Para evitar que a mortalidade com a Covid-19 seja muito elevada, a sociedade decidiu cortar a produção. Ficaremos em casa reduzindo a velocidade de difusão do vírus para não sobrecarregar o sistema de saúde. Não temos a menor ideia de como enfrentar uma crise dessa natureza.

A perda de produto será grande. Suponha uma economia que cresça 2% ao ano. Suponha que nos próximos três meses se trabalhe metade do tempo. Se, nos três trimestres seguintes, a economia voltar ao normal e se, adicionalmente, por meio de horas extras, metade da perda do trimestre for devolvida nos trimestres seguintes, a queda da economia será de 8,5%.

Há várias prioridades. Primeiro, políticas para manter todas as atividades ligadas à produção e distribuição de alimentos, bens de higiene pessoal e energia em pleno funcionamento.

O ministro de Economia, Paulo Guedes, durante anúncio de medidas contra efeitos do coronavírus na atividade
O ministro de Economia, Paulo Guedes, durante anúncio de medidas contra efeitos do coronavírus na atividade - Pedro Ladeira - 18.mar.19/Folhapress

Segundo, medidas clássicas para a manutenção da demanda, principalmente que visem sustentar a renda, que, de fato, cairá muito. A prioridade aqui devem ser as famílias que operam na informalidade, que são as mais desassistidas.

Terceiro, será necessário haver uma série de medidas de sustentação dos mercados. Principalmente dos contratos. Além de prover ampla liquidez para que as empresas consigam rolar capital de giro, manter seus empregados e pagar seus compromissos, haverá necessidade de programas para a manutenção do emprego.

Para alguns setores, como o aeroviário, por exemplo, o setor público poderá ter que garantir parte da demanda.

Os bancos públicos, BNDES, CEF e BB, terão que trabalhar em estreita associação com os bancos privados para prover a liquidez e garantir o capital de giro dos negócios. Adicionalmente, o BNDES terá papel de prover liquidez ao mercado de debêntures.

A dívida pública elevar-se-á, e, portanto, parte do custo da parada da atividade produtiva será socializada.
No curto prazo, o choque é fortemente desinflacionário. A taxa Selic deve cair mais.

Em prazos maiores, aparecerá o efeito sobre a produção. A produção irá cair muito por um ou dois trimestres. É natural que a renda gerada se reduza. Ou seja, apesar de as medidas necessárias de sustentação da renda fazerem todo o sentido, também faz sentido que todos os salários, aluguéis e lucros sejam reduzidos de alguma forma. Parte não será reduzida e irá para a dívida pública.

Não sei como implementar esse mecanismo. Mas, se 100% da renda monetária for garantida, na forma de salários, lucros, juros, aluguéis etc., toda a queda de produção será socializada por meio de
aumento da dívida pública.

O governo sinaliza que permitirá que o setor privado reduza a jornada de trabalho e os salários até a metade. A mesma medida deveria ser estendida ao setor público.

O fato de a dinâmica da dívida pública não ser prioritária agora não elimina o fato de termos de distribuir os custos de forma mais justa entre toda a sociedade. Os servidores, principalmente a elite do funcionalismo, encontram-se entre o 1% mais rico de nossa sociedade.

Finalmente, é necessário nos prepararmos para adotar a médio prazo outra estratégia.

Nada garante que a epidemia foi contida na China. É possível que a proporção de pessoas imunizadas seja relativamente baixa e, com a normalização da atividade, a epidemia volte.

Se esse for o caso, a prioridade será elevar a capacidade do sistema de saúde em lidar com essa doença. Mais leitos hospitalares com respiradores e treinamento de pessoal da saúde para lidar com a epidemia.

Até o desenvolvimento de um remédio mais definitivo, teremos que aprender a conviver com o vírus.

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