Samuel Pessôa

Pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) e da Julius Baer Family Office (JBFO). É doutor em economia pela USP.

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Samuel Pessôa
Descrição de chapéu senado inflação juros

A inação do Executivo sai cara

É espantoso o comportamento do presidente e de seu ministro da Economia

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Há duas semanas o IBGE divulgou a prévia da inflação de outubro, não muito superior ao que se esperava. A prévia foi de 0,94%, com inflação de preços livres de 1,19%. Mas começou a haver um processo de espalhamento da inflação.

Bens industriais subiram 0,88% em outubro, segundo a prévia. Deixou de ser somente um choque agrícola. Preocupa especialmente que os núcleos —índices da inflação que consideram os itens menos voláteis— tenham vindo mais fortes.

Tudo indica que 2020 fechará com inflação na casa de 3,5%. Para 2021, difícil saber. Se houver solução para nosso desequilíbrio fiscal, o câmbio deve se valorizar e as pressões inflacionárias diminuirão. A inflação em 2021 ficaria próxima de 3,5% ao ano.

Mas se uma solução para o desequilíbrio fiscal não for encaminhada pelo Congresso Nacional e tivermos nova rodada de desvalorização do câmbio em 2021 —para, por exemplo, R$ 6,5—, a inflação sofrerá nova elevação para algo perto de 4,5%. Valor claramente superior à meta de inflação para 2021, de 3,75%.

O Banco Central terá que em algum momento iniciar um ciclo de elevação da taxa de juros. E, quando isso ocorrer, pesará o fato de uma parcela de 66% da dívida pública estar atrelada à taxa de juros de curto prazo. O custo da dívida pode ficar proibitivo.

Além da inflação, a não solução do problema fiscal dificulta a retomada da economia. O motivo é que a incerteza fiscal aumenta muito o risco inflacionário. E a elevação do risco inflacionário amplia os juros de prazos mais longos. Sobem os juros nominais, e também os juros reais. A retomada pode engasgar e podemos caminhar para um cenário de estagflação em 2021-2022: economia fraquejando e inflação em alta. Não seria a primeira vez.

Frente a esse quadro, é espantoso o comportamento do presidente e de seu ministro da Economia. Temos a impressão de que o Executivo deseja reproduzir a estratégia da reforma da Previdência. Naquela oportunidade, a liderança do processo ficou com o Congresso Nacional.

Há dois problemas com essa estratégia do Executivo. A reforma da Previdência havia sido
longamente debatida no governo Temer. O tema estava maduro na sociedade. Não é o caso agora.

Segundo, a falta de ação do Executivo em um sistema presidencialista, com presidente institucionalmente forte, pode aumentar muito o custo fiscal da solução. Ocorreu assim em 2020. O fato de o Executivo ter deixado a liderança do processo de construção do pacote fiscal para enfrentar a epidemia a cargo do Congresso fez com que nosso conjunto de medidas fosse o mais caro entre os emergentes.

Por omissão do Executivo, comprometemos o futuro, dificultamos a situação das contas públicas, e jogaremos o país em risco fiscal irremediável se tivermos que enfrentar uma segunda onda da epidemia.

Cálculos do Ibre sugerem que cada 1 ponto percentual do PIB de pacote fiscal contribuiu para que a queda do PIB, em função da epidemia, fosse 0,25 pp menos intensa, o que é um multiplicador muito baixo.

Isso era esperado, já que o objetivo não foi estimular a economia, mas sim criar condições para que as pessoas pudessem ficar em casa se protegendo da epidemia. Mas é justamente por isso que era importante que a calibragem fosse a melhor possível.

Já temos um Estado de bem-estar social mais robusto do que os demais países emergentes. Não faz nenhum sentido que nosso pacote fiscal tenha sido o mais dispendioso.

O Congresso Nacional entende a situação. Mas deixado ao sabor dos acontecimentos, é difícil que haja coordenação.

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