Samuel Pessôa

Pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) e da Julius Baer Family Office (JBFO). É doutor em economia pela USP.

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Samuel Pessôa

Guilherme Boulos, o velho no novo

Seu frescor lembra o PT dos anos 1980, ótimas intenções, nenhum pragmatismo

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O jovem candidato à Prefeitura de São Paulo Guilherme Boulos é articulado, se expressa com clareza e aparentemente traz frescor à cidade.Tem uma história bonita. De classe alta, cedo foi viver e conhecer a vida e as dificuldades dos paulistanos carentes. Com interesse, portanto, ouvi a sabatina do jornal O Estado de S. Paulo da semana passada.

Repercutiu muito nas redes sociais a afirmação infeliz de que o problema do déficit da previdência é que a prefeitura não faz concurso. Segundo Boulos, novos servidores públicos contribuiriam para o sistema, reduzindo o déficit. Trata-se de um despropósito: contrata-se um servidor por 100, ele contribui com 20, reduz o déficit da previdência em 20 e eleva o gasto do município em 100!

Boulos quer trocar trabalhadores terceirizados por concursados. Para ele, os terceirizados são mais caros que os concursados. A informação está errada. Há inúmeras evidências de que o salário do servidor público é superior ao do setor privado para as mesmas ocupações.

Há iniciativas cujo custo não convence. Por exemplo, alega que fará unidades habitacionais, por meio de mutirão, por R$ 41 mil cada uma. Não parece possível. Um imóvel deteriorado no centro de São Paulo não sai por menos de R$ 1.500 o m². Também parecem subestimados os R$ 4.600 por ano para uma vaga em creche. Bem como R$ 5.700 para o salário bruto de um médico concursado pela prefeitura.

Também parece subestimada a estimativa de 437 mil passagens de ônibus gratuitas, que considera ida e volta, em cada dia útil, para gestantes, mulheres com criança de colo e estudantes.

Os R$ 14 bilhões que separou para o combate à pobreza parecem bem calibrados. Independentemente das estimativas de gasto, várias subestimadas, é na parte da receita que o candidato se perde.

Segundo Boulos, haverá três fontes de receita para financiar esses gastos, que são da ordem, nas suas contas, de R$ 29 bilhões em quatro anos: o caixa da prefeitura, o aumento do investimento e o aumento da eficiência na execução da dívida ativa do município.

Dinheiro em caixa não é receita. O caixa da prefeitura é receita já acontecida e é uma reserva financeira para gastos futuros. Certamente parte está comprometida com contas a pagar que cairão ao longo do tempo.

E certamente toda prefeitura precisa de um caixa para fazer frente às oscilações naturais da receita e despesa que ocorrem ao longo do ciclo econômico. Boulos eleito em 2020, se reeleito for em 2024, iniciará seu segundo mandato sem nenhum recurso no caixa?

A segunda fonte de recursos será a normalização do investimento da prefeitura. Segundo o candidato, na gestão Fernando Haddad, a prefeitura investia R$ 20 bilhões por ano, e, na atual, o investimento caiu à metade. Assim a “normalização” do investimento produzirá receita adicional de R$ 10 bilhões em quatro anos.

Não ocorreu ao candidato que a queda do investimento não foi uma decisão política, mas fruto de uma queda generalizada do investimento de todo o setor público brasileiro desde a grande crise de 2014-2016. Vivemos em crise fiscal permanente.

Foram a queda da receita e a elevação do gasto obrigatório (principalmente previdência) que produziram a queda do investimento, e não o inverso.

A terceira fonte de receita será o ganho de eficiência na execução da dívida ativa. A hipótese é que as administrações anteriores não quiseram arrecadar mais. Não se esforçaram. O frescor de Boulos lembra o PT dos anos 1980.

Ótimas intenções, nenhum pragmatismo e visão meio conspiratória das demais administrações. É a ideia equivocada de que fazer o bem é fácil, e não se faz pois falta vontade política.​

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