Samuel Pessôa

Pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia (FGV) e da Julius Baer Family Office (JBFO). É doutor em economia pela USP.

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Samuel Pessôa
Descrição de chapéu

70 anos do suicídio de Getúlio Vargas

A última vez que tentamos reviver o período getulista terminou na maior crise de nossa história

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No sábado, 24 de agosto passado, completaram-se 70 anos do suicídio de Getúlio Vargas.

Getúlio Vargas representou uma profunda mudança de governança do capitalismo brasileiro na direção de o Estado ser o grande intermediador da poupança nacional e, portanto, das decisões de investimento.

Na República Velha, criamos mecanismos de mercado de capitais para alocar a poupança doméstica e a poupança externa. Com eles, financiamos boa parcela das ferrovias e dos serviços de utilidade pública nas cidades brasileiras.

Fotografia em preto e branco mostra um homem de óculos sorrindo. Ele está olhando para baixo, usa terno e é calvo.
O presidente da República, Getúlio Vargas (esq.), em visita a Santos (SP) - Laércio - Acervo UH/Folhapress

Havia uma legislação de falência que dava muita segurança para o credor. O mercado de dívida era seguro. Adicionalmente, após os excessos do Encilhamento, no início da República, foi aprovada legislação que obrigava as empresas abertas a serem muito transparentes. O nível de segurança do acionista minoritário era maior do que o do novo mercado da Bovespa hoje.

Esta institucionalidade permitiu o financiamento de muita infraestrutura por meio do mercado de capitais.

Duas grandes guerras e uma Grande Depressão entre elas mudaram esse arranjo. Em parte devido a uma redução dos fluxos de capital, em parte por ideologia, nós escolhemos alterar a regulação de nosso capitalismo.

A nova lei de falência varguista dava muito poder ao devedor, e as alterações na legislação das empresas abertas deixaram de proteger o interesse dos minoritários. Nesse tipo de capitalismo, fazem mais sentido empresas familiares: a família discute direto com o chefe do Executivo nacional.

Adicionalmente, o período getulista e o interregno democrático foram de baixíssimo investimento em educação. Aceitamos enfrentar uma transição demográfica fortíssima investindo em ensino fundamental 1% do PIB.

Esse modelo entrou em crise com o esgotamento das contas públicas nos anos 1980. Após longa luta contra a inflação, o governo FHC fez esforços para a liberalização dos mercados. Note que, do ponto de vista do gasto social, o governo FHC tem herança equivalente ao do período petista. A diferença é que o PT sonha com o getulismo. Sonha com o Estado intermediando a alocação da poupança nacional.

Lula se incomoda muito com a nova Eletrobras. Há uma limitação no poder de voto do acionista majoritário: ninguém, independentemente da quantidade de ações que tem, pode ter mais do que 10% de peso na assembleia de acionistas. Limites como esse eram corriqueiros no Brasil nas primeiras décadas do século 20 e explicam em boa medida o bom funcionamento do mercado de capitais no período.

Coluna da jornalista Malu Gaspar publicada no jornal O Globo de quinta-feira (28) documenta os esforços que o governo Lula tem feito para que os fundos de previdência de empresas estatais possam investir diretamente em obras de infraestrutura. A experiência passada é muito ruim, com enormes prejuízos aos aposentados.

Com relação à companhia Vale, o presidente comentou: "Uma tal de corporate que, sabe, não tem dono. Um monte de gente com 2%, um monte de gente com 3%. (...) A Vale tinha uma diretoria, eu sabia quem era o presidente da Vale".

Lula tem muitas saudades dos tempos de Getúlio Vargas. A última vez que tentamos reviver esse período terminou na maior crise de nossa história.

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