Sílvia Corrêa

É jornalista e médica veterinária, com mestrado e residência pela Universidade de São Paulo.

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Sílvia Corrêa

Nós, os atropeladores

Ilustração para a coluna Bichos da revista sãopaulo de 22 de abril de 2018
Rodrigo Fortes

As cenas grotescas nos mobilizam rapidamente. Quem não condena o traficante que lota gaiolas no porta-malas ou o caçador que posa e posta fotos com o animal abatido? Não há dúvida: é gente como essa que ajuda a pôr fim à nossa biodiversidade.

O problema é quando a gente se dá conta que integra a lista desse tipo de gente. Isso mesmo! Mas a gente age quietinho, até sem saber, e aí parece que conta com o perdão dos ignorantes e a conivência social.

Foi assim que me senti ao ver os dados do Centro Brasileiro de Estudos em Ecologia de Estradas: 475 milhões de animais selvagens são atropelados todos os anos nas estradas do país.

Dá mais de um milhão de vidas perdidas por dia debaixo das rodas dos nossos carros. São 15 animais por segundo —dez vezes mais do que se estima que matam o tráfico ou a caça.

O número inclui vertebrados terrestres (cobras, sapos, macacos, capivaras, onças, lobos, tamanduás), muitos ameaçados de extinção. 

O centro é coordenado pelo professor de ecologia da Universidade Federal de Lavras, Alex Bager, que chegou à estimativa cruzando sucessivos estudos ao longo dos últimos seis anos.

O levantamento mostra que quanto mais carros, mais mortes: eis o motivo pelo qual o Sudeste lidera as estatísticas. E, surpreendentemente, as estradas não-pavimentadas não são significativamente menos perigosas para a vida selvagem do que as velozes e asfaltadas.

Todos os dados estão no blog de Bager. Vale a pena dar uma olhada.

No segundo semestre, o professor vai comandar a expedição Urubu na Estrada, que percorrerá 25 mil quilômetros de vias do país exatamente para tentar mapear pontos críticos e propor estratégias de conservação ao poder público local.

Sim, tem gente literalmente pondo o pé na estrada para fazer alguma coisa. E se você quer de alguma forma participar desse trabalho, pode começar baixando o aplicativo Urubu no celular. 

Hoje, 22 mil brasileiros já alimentam esse imenso banco de dados com informações sobre as mortes de animais por atropelamento.

Claro que não resolve, mas saber o tamanho do problema é o primeiro passo em direção a alguma solução.

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