Não adianta mais evitar. Por obra do presidente da República, o cocô nosso de cada dia foi parar nas manchetes dos jornais. Eu faço, você faz, a bonitona da novela faz e o Trump faz. O Bolsonaro? Ô, se faz.
A novidade é que o presidente lançou o cocô como arma de preservação ambiental. “É lógico que sim (que é possível crescer com preservação ambiental)”, disse ele ao ser perguntado sobre os impactos da agropecuária no ambiente. “É só você comer menos um pouquinho. Quando se fala em poluição ambiental, é só você fazer cocô dia sim, dia não, que melhora bastante a nossa vida também, tá certo?”
Só no Brasil, somos mais de 209 milhões de pessoas fazendo diariamente de 150 a 400 gramas de cocô. E o país joga mais da metade (55%) dessa avalanche direto na natureza, segundo dados do Instituto Trata Brasil.
São cerca de 5.700 piscinas olímpicas cheias de gordura, xixi e cocô despejadas TODOS os dias no solo, nos rios, nos mananciais e nas águas litorâneas. Isso, sim, é poluição ambiental!
E, agora, há a suspeita de que esse descarte inadequado de restos esteja na raiz de uma das maiores ameaças à saúde humana: a resistência bacteriana. Um estudo publicado pela Nature Communication mostra que os níveis de antibiótico eliminados nas nossas fezes estão ajudando a selecionar bactérias resistentes também no ambiente. Parece que só vamos entender a gravidade disso quando voltarmos a morrer de infecções banais.
Portanto, senhor presidente, há de fato evidências de que o rotineiro número 2 seja mesmo um risco, mas a solução, definitivamente, não é criar o Programa Cocô Zero ou menos ainda baixar o Minha Rolha, Minha Vida por medida provisória.
A água tratada chega a 84% da população brasileira, mas historicamente os números do esgoto são piores por absoluta falta de políticas públicas, maior custo do processo e, no final da linha, menos potencial eleitoral.
Mas tratar o esgoto (o que fazemos pouco) também não é a única solução. Há um movimento global, encabeçado pela fundação de Bill Gates, que propõe que os nossos inevitáveis restos sejam transformados em fonte de energia, o que vem sendo feito experimentalmente em países da África.
De subproduto à commodity. Quem diria... Mas aí corremos o risco de o presidente querer que a gente faça cocô três vezes por dia.
Em maio, durante a Digestive Disease Week, um seminário anual da Associação Americana de Gastrenterologia, médicos da Universidade do Texas apresentaram uma pesquisa atestando o que muita gente já sabe na prática: fazemos cocô com mais facilidade depois de tomar café. E isso não tem nada a ver com a cafeína, porque o café descafeinado teve o mesmo efeito sobre a musculatura lisa do intestino das cobaias.
O motivo do aumento do peristaltismo ainda não está claro para os pesquisadores, mas as conclusões já devem deixar os cafeicultores em alerta: pela lógica presidencial, tomar café pode se tornar em breve um ato de agressão ambiental.
É muita merda...
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