Solange Srour

Diretora de macroeconomia para o Brasil no UBS Global Wealth Management.

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O Brasil caminha para a estagflação?

Uma vez que o gênio da inflação sai da lâmpada, é difícil domá-lo de volta

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A combinação de estagnação econômica, desemprego elevado e inflação alta não é usual. A inflação é um fenômeno muito mais comum em economias com excesso de demanda do que um evento típico de economias fracas. A estagflação é uma anomalia, em geral, decorrente de políticas governamentais que interrompem o funcionamento normal do mercado.

Está cada vez mais evidente que as políticas públicas adotadas no combate à crise sanitária e seus impactos econômicos tendem a empurrar o Brasil para a estagflação.

Quando a calamidade sanitária atingiu o Brasil, já enfrentávamos sérias limitações ao crescimento. A pandemia não só escancarou o desequilíbrio estrutural das contas públicas, a baixa produtividade e os entraves ao investimento como também adicionou a esse rol a incapacidade de gestão de riscos.

A falta de coordenação e governança no enfrentamento da pandemia contribuiu para o elevado grau de contágio do vírus e para repetidos ciclos de abertura e fechamento da economia. O atraso na formulação do programa de imunização tirou do Brasil a vantagem de possuir uma ampla rede de saúde pública que seria capaz de promover a vacinação de forma rápida e eficiente.

A conjunção desses fatores gerou sucessivas prorrogações de uma expansão fiscal sem precedentes, cujos resultados ficaram bem aquém do desejado. Nada surpreendente.

Em momento nenhum nós prezamos pelo bom desenho da política pública, tivemos discernimento para deixar claro quais seriam os objetivos pretendidos, nem fizemos escolhas por instrumentos mais eficazes para tal. Pelo contrário.

Flertamos com o populismo na discussão sobre a limitação dos juros cobrados no cartão de crédito, no socorro aos estados e municípios, na investida de tirar o Bolsa Família do teto de gastos e nas inúmeras tentativas de controle de preços.

Não há motivos para comemorar o fato de que as projeções para o crescimento do PIB deste ano estejam próximas de 3,0%, dada a baixa base de comparação de 2020. Tais previsões refletem nada mais do que a expectativa de que a economia encerre o ano em nível inferior ao de dezembro do ano passado.

Na contramão do resto do mundo, novas revisões para baixo nessas estimativas são bastante prováveis —não só em razão das novas medidas de restrição de mobilidade mas principalmente pelo aperto das condições financeiras: alta de juros, desvalorização cambial e ampliação do prêmio de risco do país.

É nesse ambiente que cresce o risco de uma aceleração da inflação ainda mais forte do que a elevação já em curso. Em que pesem os altos preços das commodities e as rupturas nas cadeias produtivas, é a falta de uma âncora fiscal crível que aumenta o nível de transmissão desses choques para os demais preços da economia.

Tal movimento é turbinado pelas taxas de juros extremamente baixas e pelo aumento do risco-país, que impulsionam o processo de desvalorização do câmbio. O movimento da moeda é visto como mais persistente, intensificando demais o grau de repasse para os preços domésticos.

Inflação alta pode parecer pouco usual para uma economia fraca, mas não o é para uma economia extremamente vulnerável.

Infelizmente não resta ao Banco Central outra saída senão tentar conter o risco de a inflação sair do controle a médio prazo. Bem sabemos que, uma vez que o gênio da inflação sai da lâmpada, é difícil domá-lo de volta. As inflações implícitas nos títulos indexados ao IPCA já operam acima de 4,5% para os próximos anos.

É passada a hora de o Banco Central reconhecer que a aceleração da inflação não é um fenômeno temporário, e sim reflexo de um gradual —porém inequívoco— processo de enfraquecimento dos nossos fundamentos macroeconômicos.

Em 2022, a pandemia deixará de ser um problema para diversos países, enquanto para o Brasil a estagnação do crescimento e a alta da inflação levarão a um maior empobrecimento da população. A saída de processos de estagflação exige medidas amplas de ajuste, vontade e apoio político.

A dificuldade enfrentada para passarmos a PEC Emergencial sem grandes modificações no Congresso e a possibilidade de enfrentarmos em 2022 a mesma polarização da eleição passada trazem uma grande dúvida: se tal combinação é factível.

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