Suzana Herculano-Houzel

Bióloga e neurocientista da Universidade Vanderbilt (EUA).

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Suzana Herculano-Houzel

Plasticidade sináptica funciona na base do toma lá dá cá

Cada voz isolada se perde, mas as que falam juntas levam o neurônio a fazer isso ou aquilo

"Plasticidade” virou a nova palavra de ordem até para quem não é neurocientista se o assunto diz respeito à capacidade do cérebro de se modificar, adequar, ajustar, organizar ou reorganizar de acordo com o uso. O conceito é importante porque reconhece que neurônios não são tijolos inertes de propriedades ditadas pelos genes.

Sim, genes fazem diferença, mas mais por constituírem a receita da argila. Toda a parte sobre construir o edifício acontece ao sabor dos ventos da vida, conforme genética e experiência interagem naquele terreno que se chama biologia.

Um sítio fundamental de plasticidade no cérebro é a sinapse, ponto onde dois neurônios passam sinais um para o outro: um fala, o outro ouve e repassa o sinal.

Mas uma sinapse sozinha raramente faz verão. Cada neurônio recebe algo da ordem de dez mil sinapses diferentes, vindas de poucos ou muitos neurônios diferentes, mas sempre de vários. Cada voz isolada se perde, mas as que falam juntas levam o neurônio a fazer isso ou aquilo.

O aprendizado acontece conforme o próprio uso do cérebro vai tornando algumas sinapses mais fortes, e portanto com mais voz do que as outras, enquanto outras se enfraquecem e vão se silenciando.

Progressivos e reversíveis até que uma sinapse desapareça, esses são os processos de potencialização e depressão sináptica, que certamente estão ocorrendo no seu cérebro, leitor, neste instante, conforme você assimila este texto.

Nos EUA, a equipe do neurocientista Mriganka Sur, no MIT, demonstrou recentemente, e pela primeira vez, que potencialização e depressão ocorrem até mesmo em sinapses vizinhas em um mesmo neurônio.

Em um tour de force orgulhosamente financiado por dinheiro público, Mriganka e seus colaboradores mostraram que ao acionar especificamente uma sinapse e não as vizinhas (como acontece no cérebro o tempo todo), a proteína Arc deixa a sinapse acionada e migra para as vizinhas, onde ela causa o recolhimento dos receptores que permitiam à sinapse ser ativada. Sem isso, nem uma se fortalece, nem as outras se enfraquecem.

Ou seja: a ativação de uma sinapse causa necessariamente o silenciamento das vizinhas no mesmo neurônio, e o aprendizado acontece com redistribuição de recursos (ao menos no começo). O que parece um achado pontual é a ponta de um iceberg conceitual.

Nossas sinapses operam com recursos limitados; nós, com tempo finito e restrito para lhes dar o que aprender. O que você quer fazer com o seu?

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