Sylvia Colombo

Historiadora e jornalista especializada em América Latina, foi correspondente da Folha em Londres e em Buenos Aires, onde vive.

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Álvaro Uribe, o outono do patriarca

Estilo caudilhesco de ex-presidente já deveria ter acabado em toda a América Latina

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Na última terça-feira (8), ocorreu algo inédito na Colômbia. Um ex-presidente, e não qualquer um —mas o mais poderoso das últimas décadas—, Álvaro Uribe, 67, compareceu aos tribunais para responder a uma acusação criminal de fraude e suborno.

Depois de sete horas de interrogatório, os advogados do poderoso caudilho de direita não conseguiram livrá-lo. A Justiça determinou que Uribe continuará sendo processado.

Esse caso, na verdade, é o menor entre aqueles em que está envolvido. O ex-mandatário, que governou entre 2002 e 2010, é acusado de ter apoiado grupos paramilitares contra as guerrilhas.

uribe com dedo em riste
Ex-presidente colombiano Alvaro Uribe fala a apoiadores noa sede de seu partido, em Bogotá - Raul Arboleda - 8.out.2019/AFP

Isso significou estimular que se produzissem os chamados “falsos positivos” —assassinatos de civis de modo extrajudicial com a finalidade de atingir metas de mortes de guerrilheiros. Segundo a Human Rights Watch, essa prática fez pelo menos 2.500 vítimas.

O processo contra Uribe agora, embora apenas iniciado, é uma boa notícia para a Colômbia. Afinal, além de ter a obrigação de prestar contas à Justiça devido a crimes de corrupção e de lesa humanidade, Uribe foi um dos presidentes que mais concentraram poder no país, durante e depois de seu mandato, o que foi nocivo para a Colômbia.

Com uma popularidade que mesmo oito anos após deixar o cargo continuava acima dos 55%, Uribe conseguiu que o acordo de paz entre o Estado e a guerrilha das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) fosse derrotado nas urnas e tivesse de ser aprovado de modo trôpego pelo Congresso. Sua influência também determinou a vitória nas eleições de seus dois sucessores, Juan Manuel Santos (2010-2018) e Iván Duque.

O primeiro virou um inimigo logo depois da posse. Uribe fez de tudo para dinamitar suas iniciativas, entre elas, justamente, o acordo de paz com as guerrilhas. Já Duque, com pouco mais de um ano no cargo, tem sido obediente a Uribe, e suas decisões têm trazido problemas.

Exemplos disso foram sua tentativa de alterar o estatuto da Justiça especial para guerrilheiros e a suspensão do diálogo com o ELN (Exército de Libertação Nacional), além de ter criado mais animosidades com o ditador venezuelano, Nicolás Maduro.

Com isso, a Colômbia voltou a viver o pesadelo do aumento da violência no interior e vem comprando perigosa briga com o principal vizinho.

Finalmente, a maré está virando contra Uribe. A percepção da população de que a segurança do país, interna e externa, está em risco, a má administração de Duque e os processos na Justiça vêm desgastando sua popularidade. Segundo o instituto Gallup, sua desaprovação, em 2019, decolou para 61%.

É certo que muitos colombianos ainda o consideram um salvador da pátria, o padrinho bondoso que distribuiu casas e que, com mão dura, eliminou boa parte da guerrilha. Porém, já são mais numerosos aqueles que se cansaram de sua onipresença em todas as tomadas de decisão sobre os rumos da Colômbia. Até porque muitas foram equivocadas.

Uribe começa a sair do cenário político latino-americano, e isso é uma boa notícia. Seu estilo caudilhesco de governar é algo que já deveria ter sido ultrapassado em toda a América Latina.

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