Sylvia Colombo

Historiadora e jornalista especializada em América Latina, foi correspondente da Folha em Londres e em Buenos Aires, onde vive.

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Eleição expõe dilema do Uruguai

Ganhe quem ganhe, espera-se transição regida pela boa convivência política

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Duas perspectivas sobre o Uruguai disputam o segundo turno no domingo (24).

De um lado, os que querem a continuidade da centro-esquerdista Frente Ampla. De outro, os que preferem a renovação, embora por meio de um partido tradicional, o Nacional (blanco).

As pesquisas indicam uma disputa apertada, com vantagem para Luis Lacalle Pou (48%), do Partido Nacional, sobre Daniel Martínez (42%), da Frente Ampla.

Quem escolher a continuidade estará votando por seguir apostando no modelo que fez com que o país crescesse em média 3% em 15 anos, que diminuiu a pobreza de 40% para 9% e que ficou célebre por avanços em direitos civis. 

Os candidatos à Presidência do Uruguai, Luis Lacalle Pou, à esq., e Daniel Martínez se cumprimentam em debate eleitoral em Montevidéu
Os candidatos à Presidência do Uruguai, Luis Lacalle Pou, à esq., e Daniel Martínez se cumprimentam em debate eleitoral em Montevidéu - Mariana Greif - 13.nov.19/Reuters

Quem preferir o Partido Nacional mostrará preocupação com o aumento da insegurança no país —a taxa de homicídios disparou para a cifra de 11,8 para cada 100 mil habitantes— e com o desgaste do modelo econômico, além de preferir uma política mais aberta ao mundo.

Ambos compartilham, porém, algo que é tradicional na cultura política do Uruguai: o respeito à lei, o fato de que o Estado é laico e que os direitos civis são o que são, direitos.

É por isso que é preciso ter cuidado ao meter Lacalle Pou no que alguns chamam de “onda conservadora”.

O favorito para vencer no domingo não é um Mauricio Macri uruguaio nem um Bolsonaro uruguaio.

Sim, é um político de centro-direita, de um partido cuja tradição está relacionada à defesa dos interesses do mundo rural, mas cuja abordagem da economia é liberal e que já se comprometeu a não tentar derrogar as leis vigentes de aborto, matrimônio igualitário e regulamentação da venda da marijuana. 

O partido Nacional não se identifica com um pensamento conservador clássico, tanto que foi nele que o depois guerrilheiro tupamaro José “Pepe” Mujica começou a militar. 

No romance “A Uruguaia” (ed. Todavia), de Pedro Mairal, está descrito, ainda que de modo ficcional, o dilema uruguaio.

Nele, relata-se um dia na vida de um argentino, que, por conta das limitações da economia de seu país, tem uma conta em dólares no Uruguai e viaja regularmente para lá para buscar dinheiro.

Ao longo do dia, o protagonista do romance vai do encanto com Montevidéu —por conta da suavidade no trato dos uruguaios, da liberalidade dos costumes e das facilidades bancárias— ao pesadelo.

A mulher uruguaia que ele idealiza aparentemente o engana, ele é roubado e agredido e seus preciosos dólares desaparecem.

Ou seja, na primeira parte do dia, o personagem passeia por um Uruguai bom, que é real. E, na segunda, por outro Uruguai, que é ruim, e igualmente real. Esse dilema uruguaio está por trás do pleito de domingo.

Qual dos dois candidatos poderá garantir a sociedade igualitária, laica e próspera em que o Uruguai se transformou e, ao mesmo tempo, resolver os problemas que afligem seus cidadãos, a insegurança e o desgaste de um projeto que está há quase uma década e meia no poder?

Espera-se que o principal seja garantido. Que o Uruguai continue sendo um caso excepcional na América Latina, no qual, ganhe quem ganhe, haverá uma transição civilizada, respeitada pelas duas partes e regida pelos protocolos de uma boa convivência política.

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