Sylvia Colombo

Historiadora e jornalista especializada em América Latina, foi correspondente da Folha em Londres e em Buenos Aires, onde vive.

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Há um Alberto Fernández para cada dia da semana; qual permanecerá?

Como típico peronista, presidente argentino pende à esquerda em alguns momentos e à direita em outros

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Já há uma brincadeira rolando aqui na Argentina: a de que haveria um Alberto Fernández para cada dia da semana.

Por exemplo, um "Alberto de segunda-feira", que distribui planos de assistência para os mais pobres, um "Alberto de terça", que propõe uma reforma da Previdência, aumentando as idades mínimas de aposentadoria, e fala em ajustes das tarifas até agora congeladas.

Pode-se ainda falar de um "Alberto de quarta", que visita e bajula o papa, enquanto há um "Alberto de quinta", favorável ao aborto.

Dá para seguir com um "Alberto de sexta", que se posiciona em defesa do meio ambiente e se compromete com a luta contra a mudança climática.

O presidente da Argentina, Alberto Fernández, após a cerimônia de posse, na Casa Rosada, em Buenos Aires
O presidente da Argentina, Alberto Fernández, após a cerimônia de posse, na Casa Rosada, em Buenos Aires - Ricardo Moraes - 10.dez.19/Reuters

Esse se contrapõe ao "Alberto de sábado", que discursa a favor da instalação das mineradoras que vêm causando escassez de água nas províncias de Chubut e Mendoza. E assim por diante.

Como típico político peronista, o presidente argentino pende para a esquerda em alguns momentos e para a direita em outros.

Porém, a diferença entre seus discursos começa a preocupar aqueles que perguntam: afinal, qual é o plano para tirar esse país da crise, se é que há um?

Ao liderar uma coalizão política tão variada, por ora o presidente tem usado seu talento de negociador para manter a base de apoio unida.

Ela é composta por kirchneristas (mais radicais à esquerda), peronistas de centro, caudilhos e clãs familiares tradicionais que governam algumas importantes províncias e outras forças menores.

Entretanto, depois da trégua inicial dos primeiros meses, o presidente terá de tomar posições mais concretas, principalmente na área econômica.

Uma vitória já foi obtida durante a semana com uma sinalização positiva do FMI (Fundo Monetário Internacional) com relação à negociação da dívida, pedindo boa vontade aos credores.

Mas isso também mostra que há um Alberto que agrada a alguns —o que prometeu resolver o tema de dívida externa— e um Alberto que desagrada a outros: a opinião pública argentina, em geral, tem opinião negativa sobre o FMI e preferiria que o governo sequer cogitasse o pagamento do que deve ao fundo e a outros credores.

Isso sem falar no desdobramento do presidente com relação à sua polêmica vice, Cristina Kirchner.

Há o Alberto que a chama de amiga e conselheira, e o Alberto que diz que ela não está influenciando suas decisões —o que não é verdade, basta ler suas propostas de reforma do Judiciário e a escolha de vários ministros.

No próximo dia 1º de março, em seu discurso de abertura do ano legislativo, alguns Albertos vão sair de cena, pois o presidente terá de apresentar um plano mais detalhado para a economia e marcar posição sobre temas sensíveis e divisivos: ajustes, reforma da Previdência, negociação com o FMI, reforma do sistema judiciário, lei do aborto.

Assim que fizer isso, o verdadeiro Alberto se revelará, e isso pode reabrir a chamada "grieta" (divisão da sociedade) e reacender a polarização do país, que anda adormecida, sem opositores fazendo a crítica de suas ações.

Espera-se ansiosamente, portanto, a cara do Alberto do próximo domingo.

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