Sylvia Colombo

Historiadora e jornalista especializada em América Latina, foi correspondente da Folha em Londres e em Buenos Aires, onde vive.

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Descrição de chapéu Venezuela

Fracasso da Operação Gideon pode fortalecer ditadura de Maduro

Com episódio, ideia de que nada pode piorar na Venezuela terá de ser revista outra vez

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O líder da oposição na Venezuela, Juan Guaidó, está diante de um abismo.

Precisa apresentar evidências mais contundentes de que não teve nada que ver com a fracassada tentativa de "invasão", no último dia 3 de maio, por parte de um grupo de mercenários, que receberia uma bolada para tirar do poder o ditador Nicolás Maduro.

Se não o fizer, Guaidó corre o risco de perder o posto para outro integrante da oposição. Ou, pior, vê-la se fragmentar mais uma vez, tal qual a novela a que os venezuelanos assistem há tanto tempo.

O líder oposicionista da Venezuela, Juan Guaidó, durante sessão da Assembleia Nacional realizada em San Antonio de Los Altos
O líder oposicionista da Venezuela, Juan Guaidó, durante sessão da Assembleia Nacional realizada em San Antonio de Los Altos - Federico Parra - 18.fev.20/AFP

Guaidó já coleciona dois fracassos. O primeiro, a tentativa midiática de fazer passar ajuda humanitária a partir das fronteiras do Brasil e da Colômbia, em fevereiro de 2019.

A outra, ao sair com Leopoldo López para provocar dissidências no Exército e pressionar Maduro a deixar o poder, em abril do mesmo ano.

Sempre resisti a criticar Guaidó porque, desde que acompanho a saga da oposição contra o chavismo, nunca tinha visto um líder tão capaz de unificar as distintas vozes da opinião pública e de levar tanta gente às ruas.

Mas o episódio da Operação Gideon indica que Guaidó ou não tem ideia da responsabilidade que leva nas costas ou considera um banho de sangue como alternativa para instalar um governo transitório no país. Ambas as opções são ruins para a Venezuela.

Guaidó nega que tenha assinado o documento que aprovava a operação comandada pelo ex-militar das Forças Armadas dos EUA Jordan Goudreau.

Diz que "apenas" tinha dado sinal verde para que uma comissão "avaliasse cenários possíveis" para derrubar a ditadura.

Essa versão é negada por Goudreau e por Juan José Rendón, um marqueteiro político que deixa controvérsia por onde passa.

Guaidó o havia acolhido em sua equipe sem a menor contestação.

Rendón, que fez as campanhas eleitorais de Enrique Peña Nieto (México), Juan Orlando Hernández (Honduras) e Juan Manuel Santos (Colômbia), já foi acusado mais de uma vez de corrupção e de aceitar patrocínio de narcotraficantes e paramilitares para realizar seu trabalho.

A contratação dos mercenários não parece absurda para quem conhece sua carreira. Guaidó sabia disso e jamais deveria tê-lo trazido para seu time.

Mesmo que a assinatura não seja dele, é pouco crível que não soubesse da operação, que acabou sendo um grande papelão.

O pior efeito, porém, é o risco de que Maduro saia fortalecido, assim como Fidel Castro em 1961, quando frustrou a Invasão da Baía dos Porcos, em Cuba.

O ditador recebeu a Operação Gideon com alegria. O episódio permite que ele arme um show midiático e distraia a opinião pública dos problemas do país.

Com isso, a ideia de que nada pode piorar na Venezuela terá de ser revista novamente. Parece que sempre pode.

Se antes tínhamos a crise, a tragédia humanitária e a repressão, agora também temos a perspectiva de ver a oposição rachar mais uma vez, a cifra de mortos por coronavírus aumentar e um ditador no poder muito mais seguro do que estava antes.

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