Soft power importa e, como todo o país de ambições globais, a China investe nisso.
Os chineses têm implementado várias iniciativas para, direta ou indiretamente, melhorar a percepção do país no mundo e, por consequência, aumentar sua capacidade de atrair, convencer e influenciar o comportamento de outros atores políticos.
Para ter mais impacto no plano externo, a expansão do poderio militar e econômico da China precisa ser acompanhada de mais soft power. Desde 2007, Hu Jintao já chamava a atenção para isso.
Contribuem para o soft power chinês o crescimento econômico fabuloso das últimas décadas, pela admiração que isso gera. A cultura chinesa —incluindo artes, culinária, medicina tradicional— tem grande valor. O sucesso nos esportes gera interesse, respeito. Tecnologia e empreendedorismo chineses também.
A China certamente tem suas fraquezas: segundo o ranking Soft Power 30, restrições a liberdades individuais e à internet prejudicam a imagem do país. A 27ª posição da China nesse ranking (logo atrás do Brasil, aliás) indica que há muito a ser feito.
Os chineses enfrentam uma enorme barreira para promover suas qualidades. Entre os estrangeiros em Pequim, costuma-se ouvir que a grande muralha da China é na verdade a língua. Como se sabe, o idioma é uma janela para o país e sua cultura. Sem essa chave, perde-se acesso a muito. Mesmo que não seja indispensável ao soft power de um país, a difusão de seu idioma pode ajudar muito.
Com o objetivo de promover a cultura chinesa e o mandarim, a China criou em 2004 o Instituto Confúcio, que rapidamente se espalhou pelo mundo. Hoje há 536 institutos operando em 157 países, cerca de dez no Brasil. Na semana passada, durante a visita de Bolsonaro a Pequim, foi anunciada a abertura de mais um deles no país.
Aparentemente não no Brasil, mas a presença do Instituto Confúcio em alguns países é objeto de polêmica. Para os mais críticos, o instituto seria um presente de grego. Sob a aparência de algo benévolo, os chineses estariam se infiltrando em universidades e promovendo propaganda política.
Nos EUA, onde ventos anti-China sopram com força, algumas sedes foram fechadas por pressão de acadêmicos e políticos.
Para a China, convém cuidado: o desvio de função do instituto seria altamente prejudicial para o seu soft power. Mesmo uma atuação percebida como muito agressiva em prol da imagem-país seria contraproducente.
Tal como no caso de outros países, a promoção do soft power chinês será mais efetiva se não parecer um esforço deliberado para isso.
Para quem sedia o instituto, cabe entender o que está em jogo e defender seus interesses sem sucumbir cegamente a teses conspiratórias.
O Instituto Confúcio pode, sim, ajudar a reduzir a distância que separa a China de boa parte do mundo, algo bem-vindo em momentos que entendimento e empatia se tornaram bens escassos.
Eventuais abusos à parte, o interesse chinês em promover seu soft power por meio do idioma e da cultura é legítimo. Alemanha, França e Espanha fazem isso há décadas com o Goethe, a Aliança Francesa e o Cervantes, ainda que tenham suas diferenças em relação ao modelo chinês.
O Brasil anunciou a criação do Instituto Guimarães Rosa. Nada mais natural que a segunda economia do mundo tenha um instituto para chamar de seu.
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