Tatiana Prazeres

Executiva na área de relações internacionais e comércio exterior, trabalhou na China entre 2019 e 2021

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China corre para não envelhecer antes de enriquecer

Desafio demográfico tem implicações econômicas e sociais no gigante ainda em desenvolvimento

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Os chineses têm cada vez menos filhos. O ano de 2019 registrou o número mais baixo de nascimentos em aproximadamente seis décadas.

No ano passado nasceram 14,6 milhões de crianças, menor número desde 1961, quando foram 11,8 milhões. A taxa de fertilidade na China está em 1,6 filho por mulher, bem abaixo dos 2,1 considerados necessários para manter a população estável.

Ao mesmo tempo, chineses estão mais longevos. Em 1960, os chineses viviam em média até os 44 anos, segundo o Banco Mundial. Numa evolução impressionante, hoje, com uma expectativa de vida de 77 anos, aproximam-se de países desenvolvidos nesse quesito.

Crianças passam por porta pintada em celebração do Ano Novo chinês
Crianças passam por porta pintada em celebração do Ano Novo chinês - Wang Fei - 18.jan.2020/Xinhua

O problema é que, sob vários outros aspectos, a China ainda está longe de ser um país rico. Nesse contexto, o desafio demográfico preocupa.

Flexibilizar a política do filho único foi uma das medidas tomadas para estimular o crescimento populacional. Quando foi estabelecida em 1979, o objetivo era o oposto, ou seja, conter o aumento acelerado da população.

Em 2013, o governo permitiu que pais que fossem filhos únicos pudessem ter dois filhos. A partir de 2016, todos passaram a poder ter dois filhos. O problema é que o resultado não foi o esperado.

Houve um ligeiro aumento de nascimentos em 2016, mas os números voltaram a cair depois.

Ao longo de 40 anos, o governo conseguiu (a um custo alto) conter o crescimento da população, mas agora está difícil convencer os jovens a terem mais filhos. Educar filhos pode custar caro na China, onde as exigências e expectativas são altas.

Também a mudança de estilos de vida, a maior presença da mulher no mercado de trabalho e o custo elevado de moradia fazem com que os chineses pensem duas vezes antes de ter um, quem dirá dois filhos.

Nesse ritmo, a população começará a encolher antes do previsto —talvez em 2029 ou mesmo antes.

A mudança do perfil demográfico na China levanta questões econômicas e sociais importantes. A demografia afeta o tamanho da força de trabalho e, portanto, o potencial do crescimento chinês.

Os custos relacionados com sistema de saúde, previdência social e assistência a idosos também sobem, colocando pressão sobre os gastos públicos.

A nova estrutura demográfica chinesa também tem impacto social. Tradicionalmente na China a responsabilidade pelos idosos recai sobre os filhos. A política do filho único acabou gerando um fardo para muitos, sem irmãos com quem dividir cuidados e compartilhar custos.

A valorização do trabalho na China e as longas jornadas laborais também prejudicam a atenção com os mais velhos. O processo de urbanização, que viu jovens migrar para as cidades deixando pais no campo, idem.

O problema levou à aprovação, em 2013, da chamada emenda da piedade filial à Lei dos Direitos e Interesses dos Idosos. Controversa, a emenda fez de uma questão moral (e confucionista) uma obrigação jurídica ao prever que os filhos devem visitar seus pais periodicamente.

Filhos foram processados em alguns casos de grande visibilidade na China, talvez mesmo para efeitos pedagógicos. De tempos em tempos, cartazes no metrô e notícias nos jornais servem para lembrar os filhos de dar atenção aos pais.

Vários países no mundo sofrem com o envelhecimento e a redução da população. A questão é que, na China, isso está acontecendo antes de o país atingir o nível de desenvolvimento econômico que se vê, por exemplo, no Japão ou em países europeus.

Combinando queda da natalidade e aumento da expectativa de vida, a China corre contra o tempo para não envelhecer antes de enriquecer.

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