Sob Xi Jinping, a China lançou a maior campanha de combate à corrupção desde que o Partido Comunista assumiu o poder, em 1949. Na expressão de Xi, os esforços atingem tigres e moscas —ou seja, funcionários graúdos e bagrinhos.
Mais de 120 líderes do Partido e mais de 100 mil funcionários foram presos desde 2014. Prefeitos de grandes cidades e membros do Politburo caíram em desgraça.
Críticos alegam que Xi estaria conduzindo um grande expurgo, encerrando a carreira política de possíveis rivais. Questionam se o objetivo seria realmente conter a corrupção ou consolidar-se no poder. Ou ambos. Seja lá o que for, a campanha de Xi tem amplo apoio popular.
O Partido Comunista Chinês completou 99 anos no dia 1º de julho. Para marcar a ocasião, a agência de notícias Xinhua, ligada ao governo, publicou uma lista de frases selecionadas de Xi. São sete frases, mas o tema é um só: combate à corrupção. Pode parecer estranho comemorar o aniversário com este assunto —mas faz sentido.
O combate à corrupção é especialmente importante no contexto do modelo político chinês. Claro, é fundamental em qualquer parte do mundo —afinal, como já se disse, corrupção mata. Na China, no entanto, isso tem a ver também com a sobrevivência do regime. Eis os porquês:
1) A corrupção é especialmente danosa para um modelo político organizado em torno de um partido único e sem eleições diretas. A indignação com a corrupção e a insatisfação com o Partido têm o poder de colocar em risco todo o regime. Em outros lugares, eleições e alternância no poder servem como válvula de escape.
2) A meritocracia, fator de legitimidade do modelo chinês, é erodida pela corrupção. O argumento é de que, na China, um sistema extremamente competitivo dentro do Partido permite que os mais capazes assumam posições de comando, favorecendo gestões competentes. No entanto, se a corrupção atinge esse processo, a meritocracia torna-se slogan vazio. Em 2018, 68 funcionários do departamento responsável pelas promoções —e portanto por aferir mérito— foram afastados por corrupção.
3) A corrupção faz com que um país cresça menos do que poderia. O nível de satisfação dos chineses com seus governantes decorre sobretudo da melhora consistente dos padrões de vida. O crescimento econômico tem, portanto, exercido papel central para a legitimidade do regime.
4) A força e a união do Partido podem ser prejudicadas pela corrupção. Ela contribui para alimentar intrigas e disputas internas entre grupos diferentes dentro do próprio Partido, enfraquecendo-o. Isso ocorre em toda a parte, mas, na China, se o Partido se debilitar, o regime corre risco.
Segundo uma pesquisa do Ash Center da Universidade Harvard publicada na semana passada, apenas 35,5% dos chineses aprovavam os esforços anticorrupção do governo em 2011. Esse número subiu para 71,5% em 2016.
Se o mercado de produtos de luxo, por exemplo, sentiu imediatamente a queda das vendas como resultado da campanha anticorrupção, a percepção do cidadão comum foi mudando com o tempo.
A proporção dos que viam funcionários públicos como “limpos” passou de 35,4% em 2011 para 65,5% em 2016, segundo o Ash Center.
Os chineses podem ter visões diferentes sobre as motivações de Xi, mas isso não parece importar.
Apesar dos esforços do Partido quase centenário, o combate à corrupção não tem fim. E a imprensa oficial manda o recado para quem tiver se esquecido do assunto.
Numa das frases selecionadas pela Xinhua, Xi afirma que as regras de disciplina do Partido precisam servir como uma linha de alta-tensão —manter distância é vital. O país ganha —e o regime também agradece.
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