Tatiana Prazeres

Executiva na área de relações internacionais e comércio exterior, trabalhou na China entre 2019 e 2021

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Descrição de chapéu China Brics

China e EUA brincam com fogo, e erro de cálculo pode levar a confronto militar

Muito se fala sobre uma nova guerra fria, mas a possibilidade de guerra para valer não deve ser descartada

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​“Se a guerra estourasse hoje” é o título do vídeo promocional divulgado nesta semana pelo Exército chinês. Projetando força e cantando em uníssono, soldados se dizem prontos para morrer pela defesa de cada centímetro do território. Não é por acaso que essa peça de propaganda foi produzida agora.

Até onde vai a animosidade entre China e EUA? São reais as chances de confrontação militar? O que antes parecia impensável, agora não é mais.

O secretário de Estado americano, Mike Pompeo, cunhou nova máxima em relação à China: “desconfie e verifique”, alterando a famosa frase de Ronald Reagan sobre a União Soviética, “confie, mas verifique”.

Helicópteros AH-64E Apache disparam sinalizadores durante exercícios militares anuais em Taichung, em Taiwan
Helicópteros AH-64E Apache disparam sinalizadores durante exercícios militares anuais em Taichung, em Taiwan - Sam Yeh - 16.jun.20/AFP

O ministro das Relações Exteriores da China reconheceu que as relações com os EUA estão no seu pior momento em 40 anos.

Se é que uma confrontação pode ocorrer, os cenários mais plausíveis são o mar do Sul da China e Taiwan. O primeiro, mais provável pelo risco de um acidente. O segundo, muito mais explosivo.

Washington endureceu posição em relação às pretensões chineses no mar do Sul da China. A frequência da movimentação e a quantidade de navios e aeronaves na região aumentou. Por incrível que pareça, pode haver uma colisão não intencional. Em 2018, um choque entre embarcações militares dos dois países foi evitada por apenas 41 metros.

A situação de Taiwan, por sua vez, foi tema relativamente poupado na longa lista de atritos bilaterais dos últimos dois anos. Isso acaba de mudar. Donald Trump, o presidente-candidato, atua agora no que, para a China, é o mais nevrálgico de todos os pontos sensíveis.

Em menos de dois meses, Washington demonstrou apoio político a Taiwan com visitas históricas de autoridades de alto escalão a Taipé. Propôs pacote robusto de venda de armas para a ilha e deu novo impulso à ideia de um acordo comercial.

Em resposta, a China intensificou exercícios militares no estreito de Taiwan. Autoridades da ilha afirmaram que tal comportamento não contribui para a imagem internacional da China. Como se Pequim minimamente se importasse com isso diante do que vê como risco para sua soberania e integridade territorial.

Washington mantém a política de “uma única China”, que considera Taiwan como parte do território chinês, mas, ao mesmo tempo, rejeita a reunificação política a não ser por meios pacíficos.

Nos EUA, alguns defendem que teria expirado a validade da política de ambiguidade em relação a Taiwan. Defendem que os EUA deixem claro que, em caso de um ataque militar, os americanos sairiam em defesa da ilha —uma garantia que nunca foi dada.

Ocorre que, para a China, convém neste momento manter o equilíbrio delicado do status quo. Não pretende retomar à força o controle sobre a ilha, algo extremamente arriscado. Mas vai subir a temperatura se os americanos continuarem a empoderar Taiwan. Mais do que antes, a China de hoje se sente em condições de expressar contrariedade com a presença americana nas suas barbas.

Num ensaio sobre China e EUA para a Foreign Affairs, Kevin Rudd, ex-primeiro-ministro australiano, lembra como um incidente relativamente menor —o assassinato de um arquiduque austríaco em 1914— serviu de estopim para o início de uma guerra entre grande potências em questão de semanas. A comparação pode soar exagerada, mas o lembrete de como começou a Primeira Guerra Mundial é oportuno.

Ninguém acredita que China ou EUA, duas potências nucleares, desejem uma guerra. No entanto, uma confrontação militar pode ocorrer sobretudo por um acidente ou julgamento equivocado da posição do outro.

O problema é que um incidente pode servir de fagulha para um estrago de grandes proporções. Os canais de comunicação em alto nível não fluem bem, a animosidade é grande e, como indica o mantra do secretário Pompeo, a confiança chegou ao fundo do poço.

Nos últimos anos muito se falou sobre uma nova guerra fria. A possibilidade de uma guerra para valer não deve ser descartada.

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