No início de novembro, Xi Jinping recebeu em Zhongnanhai, a sede do governo chinês, uma visita pouco usual: dois funcionários encarregados do censo populacional da China.
São mais de 7 milhões de pessoas que, neste momento, realizam o recenseamento do país mais populoso do mundo, tarefa que se repete a cada dez anos.
Na imprensa oficial, a imagem de um líder diligente respondendo perguntas dos agentes censitários era acompanhada de mensagens sobre a importância da colaboração de todos.
Poucos dias depois, meus vizinhos encontraram questionários do censo colados às suas portas (as respostas de Xi, claro, foram registradas diretamente num tablet).
O censo de 2020 trará novidades e certamente confirmará algo amplamente sabido: a população está envelhecendo. A boa notícia é que os chineses estão vivendo mais. E a ruim é a queda na taxa de natalidade. Trata-se de enorme desafio demográfico, sobretudo pelo encolhimento da força de trabalho.
Ciente disso, o governo chinês anunciou há cinco anos o fim da política do filho único. Adotada em 1979, a lógica era conter o aumento da população para que o país enriquecesse. Era obrigação legal —e dever patriótico— que um casal se limitasse a ter apenas um filho.
Regras estritas foram adotadas para restringir o número de nascimentos, gerando, por décadas, uma infinidade de situações absolutamente dramáticas em todo o país.
A política de planejamento familiar foi flexibilizada ao longo do tempo —especialmente com o anúncio de outubro de 2015. A partir de janeiro de 2016, todos os casais estavam autorizados a ter dois filhos.
Enganou-se quem imaginava que o afrouxamento das regras provocaria diferença na taxa de natalidade chinesa. Houve, é certo, um baby boom logo após a mudança: 2016 viu um pico de nascimentos. Depois, o ritmo caiu, e a China registrou, em 2019, o menor número de nascimento em décadas.
Os chineses resistem a ter mais filhos —especialmente porque custa caro, como em toda parte. Mas, na sociedade chinesa, altamente competitiva e que valoriza educação de qualidade, talvez custe proporcionalmente mais. Ter dois filhos é sinal de riqueza.
Muitos defendem a simples abolição de qualquer limite de número de filhos. Eliminar as restrições, no entanto, tampouco resolverá o problema, considerando suas causas. Mas acabaria com o vasto aparato burocrático para controlar o tamanho das famílias. E terminaria com a apreensão daqueles que, com três filhos, ainda temem multas pesadas e outras sanções, como perda de emprego público.
É verdade que os escritórios de planejamento familiar —temidos pelos que tinham ou desejavam ter um segundo filho— estão sendo esvaziados ou tendo seu propósito reformulado.
Depois de décadas proclamando as virtudes de ter um único filho, hoje as autoridades têm, ironicamente, a tarefa oposta: convencer os chineses a terem mais filhos.
Para contribuir com esse objetivo, algumas medidas foram propostas durante a reunião do Congresso Nacional do Povo deste ano. Sem sucesso, propôs-se a redução da idade legal para casamentos —atualmente de 22 anos para homens e 20 para mulheres. Sugeriu-se, em vão, um feriado nacional para conscientizar os pais, um Dia dos Bebês Chineses —um dia de folga ajudaria, quem sabe?
Como o censo de 2020 confirmará, o fim da política do filho único teve resultados minguados, para desgosto das autoridades. Agora que o governo gostaria que os chineses tivessem mais filhos, são os pais que não querem. No passado, o governo conseguiu —muitas vezes na marra— limitar o tamanho das famílias. Convencer os chineses a ter mais filhos está se revelando um desafio maior.
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