Tatiana Prazeres

Executiva na área de relações internacionais e comércio exterior, trabalhou na China entre 2019 e 2021

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China

Vencedores e perdedores no acordo de investimentos China-UE

Ao concluir pacto com chineses, Bruxelas mostra não ser satélite de Washington

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A dois dias de terminar 2020, China e União Europeia (UE) fecharam um acordo de investimentos que estava em negociação havia mais de sete anos. Em resumo, o Acordo Abrangente de Investimentos facilita o acesso de empresas europeias ao mercado chinês e vice-versa.

O pacto é uma vitória de Angela Merkel, que administrou suspeição e resistência de europeus em relação à China. Tratava-se de uma prioridade da Alemanha, que preside o Conselho da União Europeia até 31 de dezembro. O timing da negociação não é casualidade.

As bandeiras de China, à esq., e União Europeia durante reunião em Bruxelas
As bandeiras de China, à esq., e União Europeia durante reunião em Bruxelas - Thierry Charlier - 29.jun.15/AFP

O entendimento é uma conquista para empresas europeias com interesses na China. As maiores beneficiárias são as alemãs, pioneiras no mercado chinês e hoje com vínculos sólidos no país. Na outra ponta, beneficiam-se países europeus interessados em investimentos chineses.

O bloco europeu também sai fortalecido. O resultado demonstra que interesses distintos dentro da UE não necessariamente levam à paralisia. Em 2020, aliás, os europeus conseguiram aprovar um pacote histórico de resgate econômico, concluíram o acordo comercial com o Reino Unido e, para completar, fecharam este acordo de investimentos com a China. Não é ruim para um projeto frequentemente acusado de ultrapassado.

A China também ganha com o acordo. Soube aproveitar a janela de oportunidade que estava se fechando. A partir de janeiro, não haverá mais o impulso alemão à frente do Conselho e, sobretudo, a relação transatlântica mudará com Joe Biden nos EUA.

A conclusão das negociações gera incômodo nos EUA. A menos de um mês da posse do novo presidente, muitos imaginavam que os europeus fossem se coordenar com os americanos antes de uma decisão como esta.

Muitos em Washington se questionam se podem mesmo contar com a UE para formar uma parceria anti-China. Trata-se de dúvida saudável. Se é verdade que os europeus compartilham uma série de preocupações dos americanos a respeito de Pequim, o fato é que Bruxelas não se comporta como irmão menor de Washington.

Os EUA negociaram sozinhos a chamada fase 1 do seu acordo comercial com a China, garantindo a empresas americanas vantagens no mercado chinês. Entrou no pacote, por exemplo, a flexibilização da exigência de que empresas americanas tivessem parceiro chinês para investir no país. Trata-se de demanda antiga de corporações de todo o mundo, mas que, no acordo bilateral, beneficiou apenas as americanas.

Ao concluir seu próprio acordo com Pequim, a UE inicia um diálogo com a administração Biden a partir de bases mais equitativas.

Os europeus alegarão que todos ganham com os novos compromissos chineses em relação à transparência da atuação de empresas estatais e à concessão de subsídios industriais. Outros países também se beneficiariam de obrigações assumidas pela China em matéria trabalhista. Isso ajudaria a equilibrar as regras do jogo para todos, argumentarão. Não é mentira.

Mas o fato é que quem fica de fora perde. Os americanos perdem mais —por motivos econômicos e sobretudo estratégicos. Terceiros países, por um lado, também perdem à medida que europeus e chineses garantem acesso privilegiado aos seus mercados, em detrimento de empresas de outras origens.

Por outro lado, diante das tensões entre China e EUA, o mundo ganha com uma Europa mais forte, que exerça sua autonomia estratégica, que seja capaz de lidar com a China como parceira, competidora e rival ao mesmo tempo, como a Comissão Europeia definiu em 2019.

Que Pequim não se iluda. Cada vez mais, a China divide corações e mentes na Europa, coloca em conflito valores e interesses europeus. O processo de aprovação deste acordo no Parlamento Europeu encontrará resistências e servirá de alerta para quem, no país asiático, distrair-se comemorando o feito de 2020.

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