Tatiana Prazeres

Executiva na área de relações internacionais e comércio exterior, trabalhou na China entre 2019 e 2021

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Sanções internacionais contra a Rússia dificilmente salvarão a pátria

Talvez seja esperar demais que elas em si, por mais duras que possam ser, façam Putin mudar de ideia

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O que fazer diante do avanço de Putin na Ucrânia? A pergunta deixou de ser hipotética nesta semana. O resultado é que as sanções passam a ocupar o centro das atenções internacionais.

Fala-se, por exemplo, em suspender compras de gás e petróleo da Rússia, limitar o acesso do país ao sistema financeiro internacional, restringir a venda de determinados produtos, congelar ativos de certos cidadãos ou empresas e mesmo excluir Moscou do Swift, o sistema de pagamentos internacionais.

Homens em meio a carrinhos de bagagem abandonados em via no aeroporto Borispil, em Kiev - Umit Berkas - 24.fev.22/Reuters

Sanções econômicas são desenhadas para afetar o cálculo político de quem decide —no caso, para fazer Putin recuar. Normalmente, à medida que o problema se agrava, punições mais dolorosas entram no pacote.

Nesta semana, vários países já anunciaram medidas contra a Rússia. Toda a fúria contra Putin tomará a forma de sanções —rápidas e severas, nas palavras dos EUA. Mas tem um detalhe: isso não costuma funcionar.

Convém mesmo moderar expectativas, porque as sanções internacionais não têm histórico brilhante. Se o objetivo é forçar uma mudança de comportamento, elas têm falhado, de Cuba à Coreia do Norte, do Irã à Venezuela, passando pela Síria. Decerto, a situação econômica desses países é seriíssima (e a população local sofre as consequências). Mas anos ou mesmo décadas de punições foram incapazes de convencer seus líderes a fazer o que se esperava deles.

Sanções internacionais embutem riscos econômicos e políticos também para quem as adota. Quase sempre quem aplica as medidas sente um pouco da dor. Por exemplo, deixar de comprar gás de Moscou significa, para a Alemanha, renunciar à sua principal fonte de suprimento externo. Para os EUA, isolar a Rússia tem o efeito de aproximá-la da China. Numa sanção para valer, é difícil evitar o efeito tiro no pé.

As medidas, claro, costumam ter impacto econômico significativo sobre o país afetado, além de levá-lo a certo isolamento internacional. Nessas circunstâncias, é possível que a insatisfação gerada principalmente pela deterioração da economia seja canalizada contra as autoridades locais, criando um caldo pró-mudanças.

Mas é também possível que a população acabe culpando as potências estrangeiras pelos males domésticos. Em Cuba, na Venezuela e alhures, autoridades locais exploram justamente essa narrativa. As sanções, em vez de incentivar a mudança de comportamento, podem ter o efeito contrário —elas poderiam estimular a resistência, mesmo que a um custo humanitário alto.

Assumindo que seja ancorada no direito internacional, a sanção boa é aquela que não precisa chegar a ser aplicada. É quando a ameaça crível de que há um preço alto a pagar basta para fazer um líder pensar duas vezes, por exemplo, antes de invadir outro país.

No entanto, o histórico ruim das sanções internacionais compromete seu potencial dissuasório —inclusive na Rússia de hoje. Em 2014, na sequência da anexação da Crimeia, o Ocidente impôs um pacote de sanções. É certo que a economia e a população sofreram em função das medidas, mas, se o objetivo era fazer Moscou desistir da operação, as medidas fracassaram. Mais, ainda fragilizaram o país, mas não seu presidente.

O ataque russo à Ucrânia nesta semana comprova que, para Putin, a perspectiva das sanções não exerce efeito dissuasório. Talvez seja esperar demais que elas em si, por mais duras que possam ser, façam-no mudar de ideia.

O melhor que se poderia esperar dessas punições é que sirvam de incentivo para uma negociação real. Sanções apenas, por mais rápidas e severas que sejam, dificilmente salvarão a pátria.

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