Tatiana Prazeres

Executiva na área de relações internacionais e comércio exterior, trabalhou na China entre 2019 e 2021

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Afinal, o que Taiwan tem a ver com a Ucrânia?

Para Pequim, uma 'Otan do Pacífico' repetiria o mesmo erro da original

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Taiwan sempre vem à tona nas análises sobre a posição da China a respeito da guerra na Ucrânia.

Tanto Ucrânia quanto Taiwan são objeto de pretensões territoriais de uma potência —Rússia e China, respectivamente. Especula-se sobre o futuro da ilha diante da situação do país do Leste Europeu. Alguns opinam que a falta de um apoio mais decisivo do Ocidente a Kiev teria o efeito de encorajar uma aventura militar por parte da China em relação a Taipé.

Protesto contra a guerra na Ucrânia em Taipé, em Taiwan - Ann Wang - 13.mar.22/Reuters

O interessante é que, apesar das grandes divergências, tanto os EUA quanto a China rejeitam a comparação. Para os americanos, Taiwan tem um valor estratégico que a Ucrânia não tem. Em relação à ilha, há a conhecida política de ambiguidade: com o objetivo de dissuadir Pequim, Washington, de maneira deliberada, não deixa claro se defenderia militarmente Taiwan em caso de um ataque chinês.

Em relação à Ucrânia, não há nada equivalente. Ao contrário, numa política de clareza cristalina, os EUA anunciaram desde antes da invasão russa que, se houvesse uma, eles não enviariam tropas para socorrer o país europeu. Diante da diferença, a China não deveria extrair lições erradas a partir da natureza do envolvimento americano na Ucrânia.

Por via das dúvidas, nos primeiros dias da guerra, Washington mandou uma delegação de autoridades para Taipé, reiterando o apoio e transmitindo a mensagem a Pequim.

Para a China, a analogia não se sustenta porque as circunstâncias são radicalmente distintas. A Ucrânia é um país independente. Taiwan, ao contrário, é reconhecida apenas por cerca de uma dúzia de nações. O princípio da integridade territorial conta a favor de Kiev, mas favorece Pequim nas suas pretensões sobre Taiwan.

Os chineses querem evitar paralelos com Taiwan, por tratar o tema como assunto interno, mas estão de olho especialmente nas sanções robustas à Rússia, como também no envio de material bélico à Ucrânia, na resistência dos locais e nas repercussões globais do conflito.

Apesar de rechaçadas pelos EUA e pela China, as comparações prosperam, inclusive em Taipé. "Ucrânia hoje, Taiwan amanhã" é um slogan que circula na ilha. Taiwaneses veem armas e ajuda humanitária entrarem no país europeu, mas não tropas estrangeiras —e se perguntam se seria apenas esse o tipo de apoio que lhe seria oferecido em caso de uma ação militar chinesa.

Há o receio, em Pequim, de que a invasão da Ucrânia incentive o Ocidente a aumentar seu apoio a Taiwan. O objetivo seria dissuadir a China de fazer o mesmo que a Rússia —isso, no entanto, perturbaria um equilíbrio delicado que evita um confronto na região há quatro décadas.

Os chineses receiam a formação de uma "Otan do Pacífico" voltada contra si. O Quad, arranjo que envolve EUA, Japão, Índia e Austrália, poderia ser seu embrião. A Coreia do Sul considera se juntar ao grupo. O próprio secretário-geral da aliança militar passou a tratar a China como uma ameaça.

Pequim atribui à Otan a responsabilidade sobre o conflito atual e, ao aventar uma Otan do Pacífico, sugere que ela possa vir a reproduzir os mesmos problemas da original. Ou seja, provocar enormes riscos por desconsiderar os interesses de segurança da China —o que a Otan teria feito com Moscou ao se expandir até as fronteiras da Rússia.

Nessa base, condenar a Otan, alianças militares e a mentalidade de Guerra Fria é um elemento central da narrativa chinesa sobre a guerra na Ucrânia.

Apesar de Washington e Pequim concordarem que Ucrânia e Taiwan não são comparáveis, as duas grandes potências olham para o tabuleiro da Europa com a cabeça também na Ásia.

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