As eleições parlamentares húngaras, que ocorrerão no começo de 2022, parecem um déjà vu do nosso futuro: é como ver um prelúdio do que veremos por aqui, apenas alguns meses antes de nós. A diferença é que no Brasil a situação é pior. Lá toda a oposição, da direita à esquerda, se uniu numa frente única (algo mais difícil num presidencialismo multipartidário). Lá não temos ameaça de desordem pública pela parcela policial minoritária —mas ruidosa— cooptada pelo bolsonarismo (algo mais fácil num país onde a polícia fuzila jovens).
Sob protestos, o premiê Viktor Orbán aprovou na terça (15) uma lei que proíbe disseminar em escolas conteúdos que venham a ser entendidos como promoção da homossexualidade ou transgeneridade. Orbán, como Bolsonaro, apela a valores supostamente tradicionais para criar a retórica de nós vs. eles. Política seria, assim, o exercício do inimigo, mantendo a política grandiosa (quer-se renovar a nação) e disruptiva antissistema (contra tudo o que está aí). Por aqui, prega-se a abstinência como saúde pública e quer-se proibir Anne Frank por referências à descoberta sexual.
Orbán, como Bolsonaro, não é conservador. É reacionário. Não quer proteger a família, quer instrumentalizá-la. Para ambos não importa que a família, desde 2005, não seja mais pai-mãe-filho. Novos arranjos familiares como mães e pais solteiros, ou avós criando netos, são maioria no Brasil, inclusive LGBTs que formam e pertencem a famílias. Orbán e Bolsonaro postulam a tese da ameaça, vide Hirschman em “A Retórica da Intransigência”: reacionário é quem vê na mudança um perigo oneroso demais, prometendo um retorno à certeza moral.
O que pende a balança da democracia ao nosso lado é que, Orbán, diferentemente de Bolsonaro, é mais poderoso. Perto de Orbán, Bolsonaro parece um novato incompetente no curso de como as democracias morrem. Isso não significa que o presidente incompetente cheio de certeza não tente tomar o poder que nunca teve aos barrancos e à força.
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