Nada mais realpolitik que candidatos mudarem de posição ao sabor da audiência eleitoral. O problema não é o pragmatismo político, afinal eleição é para se ganhar. O problema é, sob o efeito da sede ao pote, correr-se o risco de atravessar a rua para escorregar na casca de banana que está do outro lado da calçada. Foi nessa realpolitik embananada que o candidato a governador do RJ, Marcelo Freixo, se trumbicou em entrevista nesta quarta-feira (17).
"Sou contra qualquer coisa que venha dividir a sociedade brasileira hoje. Não sou favorável [à legalização da maconha]." Questionado, complementou: "não sou mais a favor. Não acho que isso vai, nesse momento, nos ajudar no Brasil. O que a gente precisa é avançar nas políticas de saúde e na eficiência da polícia", disse na TV Record. Trata-se de uma guinada brusca para quem defendia até ontem, com razão, que a guerra às drogas significa prender e matar jovem pobre negro da favela.
A casca de banana na qual Freixo se trumbicou seria fácil de desviar: não lhe cabe legalizar ou não maconha posto que é competência federal. O erro de Freixo, mesmo sendo o mais preparado na corrida eleitoral, foi mais grave, no entanto. A escolha não é entre pragmatismo político, de um lado —sinônimo de conservadorismo na terra de Bolsonaro— e fracasso eleitoral, de outro. Freixo poderia ter rebatido a pergunta em outros termos. Poderia ter focado no impacto desigual da guerra às drogas: 86% dos mortos em operações no RJ são negros, enquanto a elite pede delivery de maconha no Leblon. Poderia ter focado na economia. RJ gasta R$ 1 bilhão no combate às drogas e falta dinheiro pra escola e saúde. Poderia ter focado em segurança. Enquanto perde tempo com bangue-bangue, RJ esclarece apenas 14% dos homicídios.
Se pragmatismo fosse justificativa para não oferecermos alternativas à máquina que mói a carne preta todos os dias, de que adianta gritar que as vidas negras importam se, na hora que vale, não importam tanto quanto a cadeira que se almeja?
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