Tom Farias

Jornalista e escritor, é autor de "Carolina, uma Biografia" e do romance "Toda Fúria"

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Tom Farias

Na era digital, destino das bibliotecas talvez seja servir de cenário para selfies

Avanço da tecnologia permitiu fazer pesquisas a distância, sem falar dos livros disponibilizados no Google e dos PDFs piratas

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Uma imagem da biblioteca Luís Ángel Arango, no centro da cidade de Bogotá, imponente prédio de quatro andares —um deles só dedicado a música, onde se veem instrumentos musicais usados em épocas remotas pela civilização que viveu naquela região—, me fez refletir sobre até aonde vamos com as nossas bibliotecas e as do mundo.

Em plena era tecnológica, sobretudo virtual, vejo com certo pessimismo o avanço da expansão das bibliotecas pelo mundo, especialmente no Brasil. A biblioteca colombiana me fez acender uma luz amarela sobre o assunto, uma vez que é bem comum hoje fazermos tudo a distância, sem precisarmos nos deslocar da nossa bolha, sobretudo para consultar livros ou fazer pesquisas sobre mapas, documentos e jornais antigos.

Sou do tempo que, durante o ensino médio, éramos obrigados a ir constantemente, e em grupos, às bibliotecas próximas de casa e da escola, para fazer trabalhos de conclusão de período ou para alguma prova importante. Muitas vezes, chegávamos à antiga biblioteca Celso Kelly, na avenida Presidente Vargas, no centro do Rio de Janeiro, e tínhamos de esperar a turma da frente, que chegou primeiro, terminar o trabalho escolar sobre certa obra, já que, geralmente, coincidia de uma escola pedir algo sobre o mesmo tema da outra.

Eu passei por situações como essas diversas vezes. Além disso, éramos obrigados a copiar todo o assunto a ser pesquisado: fosse de história, fosse de literatura, fosse de geografia, fosse de moral e cívica. Outra coisa, íamos uniformizados, para incutir na mente do atendente do local que era coisa séria, e não estávamos roubando nem o tempo, nem o lugar de ninguém, ou cabulando aula. Para isso, em quase todas as ocasiões, ainda apresentávamos o pedido da pesquisa a ser realizada para a bibliotecária que nos atendia, em papel timbrado da escola.

Hoje o mundo está tão esquisito que eu não imagino ninguém mais fazendo isso. Por outro lado, as bibliotecas ficaram tão gigantescas que algumas delas precisam do espaço equivalente a alguns Maracanãs para guardar todos os seus livros e peças.

Isso é sério. Entre as dez maiores bibliotecas do mundo, a British Library, ou biblioteca britânica, no Reino Unido, tem hoje 200 milhões de itens, organizados no equivalente a 388 milhões de prateleiras. É praticamente um Brasil, se cada livro fosse um brasileiro.

O mundo está repleto de bibliotecas assim. A nossa, a Biblioteca Nacional, é a maior da América do Sul, mais é a menor de todas: tem 9 milhões de itens no acervo. Em comparação às dez mais, está engatinhando.

No gigantismo, seguem a Biblioteca do Congresso, em Washington, com cerca de 170 milhões de itens; a Biblioteca de Xangai, na China, com 56 milhões, que está construindo um banco genealógico com dados de quase 50 mil árvores; a New York Public Library, biblioteca pública de Nova York, com seus atuais 55 milhões de peças e livros. Esta é outro complexo gigantesco, partindo de Manhattan, onde fica seu prédio principal.

São muitas e encantadoras as bibliotecas. Por exemplo, a Biblioteca Estatal Russa: compreende coleções nacionais e estrangeiras exclusivas em 367 idiomas do mundo. O tamanho de todo o acervo ultrapassa 47,4 milhões de itens valiosos.

Cabe destacar ainda a Biblioteca Nacional da França, na qual a nossa tenta, tadinha, se espelhar. Sua história remonta a 1368, quando Carlos 5º fundou a biblioteca real no Palácio do Louvre, que desapareceu. Em 1461, Luís 11 começou outra, que cresceu até ser aberta ao público 30 anos depois, e que sobreviveu mesmo à irá da Revolução Francesa. Não é a maior do mundo, com seus 40 milhões de itens, mas tem um respeitável orçamento de US$ 288 milhões ao ano.

Com o mundo tão tecnológico e virtual, fico imaginando o destino das bibliotecas. Hoje podemos fazer pesquisas a distância: as hemerotecas dão acesso a publicações, recentes e históricas, de modo imediato.

Outra coisa são as piratarias dos PDFs: vira e mexe coleções de livros aparecem nas nossas caixas de emails nos oferecendo clássicos da literatura brasileira e universal. De graça.

E o que dizer das obras que podem ser consultadas, já escaneadas, pelo Google? Eu mesmo me surpreendi ao acessar a edição original de 1843 de "O Filho do Pescador", de Teixeira e Sousa (1812-1861), o nosso primeiro romancista brasileiro.

Com todas essas facilidades e uma juventude cada vez mais digital, fica difícil pensar as bibliotecas, por mais equipadas e suntuosas que sejam, não sendo palcos para outro uso que não seja da visitação pública e cenário para selfies.

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