Tom Farias

Jornalista e escritor, é autor de "Carolina, uma Biografia" e do romance "Toda Fúria"

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Tom Farias

Como os patetas de ontem e de hoje nos fazem rir e chorar ao mesmo tempo

Pela má 'atuação', os palhaços como Bolsonaro e Milton Ribeiro precisam ter a correção que só a Justiça pode lhes dar

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Toda esta patacoada encenada na Esplanada dos Ministérios, em Brasília, reveladora das suspeitas de corrupção e tráfico de influência no Ministério da Educação, na gestão do ex-ministro Milton Ribeiro, com a cumplicidade do presidente Jair Bolsonaro e seus protegidos, os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura, me fez recordar meus tempos de menino de calça curta quando assistia, pela TV em preto e branco da minha mãe, me mijando de rir, aos hilários episódios do seriado "The Three Stooges" –mais conhecido no Brasil como "Os Três Patetas".

Um dos episódios por mim revistos esta semana, produzido pela imbatível Columbia Pictures, tem como título "From Nurse to Worse" —em tradução canhestra "Os Três Malucos entre Loucos", exibido em 1940, mas que ainda me faz dar boas e gostosas gargalhadas.

Na acepção do termo, o nome "Stooges" quer dizer algo como "capachos", designando acesso. "Escada", para a comédia, é uma espécie de apoio ao ator principal, que entra ou conduz a cena. No Brasil, a designação ficou como sendo "patetas", semelhante a bobos ou palhaços. Já em Portugal o termo usual ficou "estarolas", próximo da palavra estroina, leviana.

Os "patetas" do Planalto não me fazem rir, como os patetas da comédia americana, muito pelo contrário. Em verdade, sou acometido de uma grande e profunda tristeza, quase um luto, como na visão do filósofo Renato Noguera, ao ver em que mãos o meu país se encontra.

Integrantes do grupo Movimenta fazem intervenção em frente ao Palácio do Planalto. O ato faz referência à fala do presidente, que disse que colocaria a cara no fogo pelo ministro Milton Ribeiro
Integrantes do grupo Movimenta fazem intervenção em frente ao Palácio do Planalto; o ato faz referência à fala do presidente, que disse que poria a cara no fogo pelo ministro Milton Ribeiro - Gabriela Biló/Folhapress

No episódio mencionado acima, os três amigos —Moe, Larry e Curly—, que vivem de dar golpes, encontram um perfeito comparsa, vivido pelo excelente ator Lynton Brent, que os convence sobre a compra de uma apólice de seguros com a qual irão ganhar muito dinheiro fácil e, obviamente, deixar de trabalhar —coisas que nenhum deles gosta de fazer na vida.

Para tanto, basta alguém se passar por louco, o que não é coisa difícil, pois o seguro é para esse fim. Na pele de louco, no entanto, ninguém melhor do que Curly Howard, o mais maltratado do grupo, tendo como coadjuvante Larry Fine, e, no comando da dupla, o impagável Moe Howard.

Até esse ponto já é muito difícil segurar a risada. O trio chega ao consultório do hilário Dr. D. Lerious, muito bem vivido pelo comediante Vernon Dent —uma das grandes estrelas da comédia americana, que antes de ficar cego, por causa de diabetes, nos idos dos anos 1950, já tinha no currículo mais de 400 filmes, incluindo vários com os tais patetas, aos quais fazia contraponto ou dos quais era o principal antagonista.

No consultório, lugar que já é uma piada, Curly chega na posição de um cachorro ensandecido, atado a uma coleira, latindo e rosnando, puxado pela mão de Moe, dando a impressão de que é mesmo um animal, cena que não só a ele convence, mas a nós outros, o próprio Dr. D. Lerious e sua assistente, visivelmente assustada.

A cena é gostosa e divertida e vai, é claro, dar "ruim", como se diz, por aí, na gíria, para o lado dos três atrapalhados armadores.

Como toda comédia tipo pastelão ou da chamada "farsa física", trabalhada com o corpo —aquelas quedas abruptas no chão, dedadas nos olhos, puxões de orelhas e cabelos, tapas na cara um do outro—, a probabilidade de risadas é totalmente certa, ainda mais quando estão em cena três dos melhores interpretes cômicos que animaram a minha e tantas outras gerações.

Parece que estamos vivendo cenas idênticas de personagens reais travestidos de Moe Howard, Larry Fine e Curly Howard em Brasília. Na pele de Moe, ninguém menos que Gilmar Santos, líder dos pastores, e de Curly, o ex-ministro Milton Ribeiro —e não só por causa de serem ambos carecas. Enquanto Arilton Moura cai bem na figura de Larry. Os três, juntos ou separados, dão muito trabalhado para o tal Dr. D. Lerious— ou, melhor dizendo, Jair Bolsonaro.

Na cena dos "Três Malucos entre Loucos" tudo justifica as cabeçadas que os três dão para "arranjar" uma grana fácil, dando cada vez mais sinais de que são atrapalhados e se enrolam com as próprias histórias que inventam.

No cenário atual, o do Ministério da Educação, estamos vendo a comédia se repetir como uma farsa —o então ministro se denuncia a si próprio num áudio e ainda enrola o chefe, que tenta desfazer o desmentido e acaba se atrapalhando tanto quanto o seu ex-subordinado.

Na sequência do episódio americano de 1940, os três são presos —qualquer semelhança é mera coincidência?— e o chefe, que tenta avisá-los do flagra, a chegada da polícia, acaba também sendo denunciado já que o pateta-mor, o mais trapalhão de todos, revela num áudio o que o chefe quis dizer escondido e que era para ser segredo apenas dos dois.

Piada pronta e hilário demais. Mas triste demais também.

O grupo original de "Os Três Patetas" estava em atuação desde 1922, ou seja, há exatos cem anos. O mais famoso, e que chegou até nós, é Curly Howard, que viveu de 1903 a 1952; seu irmão, Moe Howard, de 1897 a 1975 e, por último, Larry Line, de 1902 a 1975. Eles fazem parte de um bom tempo da comédia —herdada magistralmente por outro gênio, Charles Chaplin, que viveu de 1889 a 1977.

No Brasil, uma das mais vivas encarnações é a do palhaço negro Benjamim de Oliveira, que viveu entre 1870 e 1954, e o grupo Os Trapalhões, certamente a cópia mais bem acabada de uma mistura de Os Três Patetas com Charles Chaplin.

Ao contrário do que acostumávamos a ver na televisão no passado, com cenas sem dupla intenção e piadas sem duplo sentido, as cenas brasilienses de hoje são bem repugnantes, imorais e impróprias. E seus "atores", pela baixa qualidade e má "atuação", precisam ter a correção que somente a Justiça pode lhes dar.

Que não tarde muito a chegar, para que possamos, munidos de muita pipoca, voltar a nos divertir diante da telona da televisão, assistindo, especialmente, a muitas comédias, mas brasileiras.

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