Tom Farias

Jornalista e escritor, é autor de "Carolina, uma Biografia" e do romance "Toda Fúria"

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Anielle e Sônia Guajajara acenam com esperança de um país melhor

O olhar certeiro do presidente Lula as guindou para duas áreas prioritárias

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Depois dos atos vergonhosos do dia 8 de janeiro contra a democracia, por aliados do terrorismo político e adeptos ao bolsonarismo, um raio de esperança surgiu nos horizontes de Brasília: as posses de Anielle Franco, para o Ministério da Igualdade Racial, e de Sônia Guajajara, para o Ministério dos Povos Indígenas.

Sem qualquer sombra de dúvida, são duas mulheres bastantes experientes e preparadas para assumir qualquer função pública ou privada, mas o olhar certeiro do presidente Lula as guindou para duas áreas prioritárias da administração pública federal, de suma importância dentro do cenário de caos instituído —a que o país foi jogado especialmente nos últimos quatro anos– no que tange às ofensas raciais cotidianas e ao acelerado desmatamento diário da floresta amazônica brasileira.

Anielle Franco e Sônia Guajajara durante a cerimônia de posse, no Palácio do Planalto - Sergio Lima - 11.jan.2023/AFP

Cada uma a seu modo, mas ciente do tamanho do desafio diante de uma nação perplexa, Anielle e Sônia trouxeram em suas falas mensagens elaboradas a partir da necessidade de um alinhamento de reconstrução nacional, condizente com as pautas que enfeixam as missões de seus órgãos e a urgência das ações que esses temas da diversidade e dos povos originários exigem no contexto brasileiro.

O novo governo sinalizou bem ao criar um ministério que cuide diretamente da população indígena, à mercê da própria sorte há 523 anos, e ao editar o decreto que equiparou a chamada ofensa racial ao crime de racismo, tornando-a também inafiançável e imprescritível para o Código Penal.

Tirando o cenário de devastação que tomou conta do Palácio do Planalto, a posse das duas ministras diz muito da simbologia dos cargos e da premissa de que a presença dos seus corpos –um negro e outro indígena– recompuseram a energia do ambiente, numa demonstração vital da força do poder constitucional da República contra qualquer ato de vandalismo e ignorância, como os perpetrados pelo bolsonarismo ensandecido e que beira à psicopatia.

Ponto alto de suas falas potencializadas, as ministras ecoaram gênero e ancestralidade, união –entraram no recinto de mãos dados– e fé –falaram de reparação e combate à injustiça social, racial e econômica.

Sônia Guajajara –ou Sônia Bone de Sousa Silva Santos– é originária das matas das terras indígenas Arariboia, no Maranhão, onde vivem os povos guajajara/teneteara. Tem expressiva carreira política e acadêmica, destacando-se como uma das maiores intelectuais indígenas brasileiras da atualidade, sendo incluída no ano passado na lista da revista Time como uma das cem pessoas mais influentes do mundo. No último pleito eleitoral, elegeu-se a primeira deputada federal indígena pelo estado de São Paulo, com 156.966 votos.

No último dia 11, ao tomar posse, seu discurso foi pautado na direção do ecossocialismo e na preservação da floresta e dos seus povos. "Quem não pode com a formiga, não assanhe o formigueiro", assinalou a ministra, sob forte emoção e bastante aplaudida por um ambiente lotado, de ativistas e autoridades, entre as quais os ministros Sílvio Almeida, de Direitos Humanos, e Marina Silva, de Meio Ambiente e Mudança Climática.

Já Anielle Franco provou que o legado de sua irmã, a vereadora assassinada Marielle Franco, está vivo e pulsa em suas veias. Acompanhada da família, Anielle deu o tom que faltava às cerimônias de posse ocorridas para a instalação do governo Lula, iniciadas em 1º de janeiro.

Cria do Complexo de Favelas da Maré, no Rio de Janeiro, onde ela e a irmã se criaram, Anielle Franco —aliás Anielle Francisco da Silva— é referência de superação, saindo de um lugar marginalizado, excluído das políticas públicas, para exemplo positivo para novas gerações. Ativista feminista, escritora e gestora social, ela acessou a universidade, fazendo carreira acadêmica. Ou seja, sabe o que dizer e diz de forma altissonante.

O fechamento do seu discurso tornou-se emblemático com a leitura do poema de Conceição Evaristo, "Vozes-Mulheres", publicado pela primeira vez em 1990 nos Cadernos Negros, estreia literária da autora e que hoje compõe o erudito "Poemas da Recordação e Outros Movimentos". O poema, que evoca a sua ancestralidade, pode ser considerado a "profissão de fé" da escritora mineira. Anielle, com ele, enaltece valores, os ecos e memórias dos "porões do navio", onde se encontram muitos "lamentos de uma infância perdida", ou milhares de vidas, em gerações.

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