Médico e ex-jogador, é um dos heróis da conquista da Copa de 1970. Afastou-se dos campos devido a um problema de descolamento da retina. Escreve às quartas-feiras
e aos domingos.
Saudades do que não existiu
O São Paulo já tem um atacante veloz, driblador e que atua pelos lados, como Muricy tanto pediu. Mas não foi o suficiente para ganhar do Corinthians. Centurión, que estava tímido, triste, calado, sem amigos e perdido em São Paulo, como disse Muricy, antes da partida, e que, por isso, quase não foi escalado, foi o mais descontraído, alegre e melhor jogador do Tricolor. Já vi muitos atletas com esse perfil.
O Corinthians lembra-me o Boca Juniors, dirigido pelo papa-títulos da Libertadores Carlos Bianchi, que, uns dez anos atrás, formava também duas rígidas linhas de quatro, sem espaços entre elas, e ganhava nos contra-ataques. Diziam que os brasileiros não conseguiam furar a retranca argentina. Essa postura é comum, desde a Copa de 1966, quando a Inglaterra foi campeã. Agora, virou modernidade.
Quando um time com duas linhas de quatro marca mais à frente, se torna ofensivo, como ocorre muitas vezes com o Corinthians.
Muricy e as viúvas de Kaká lamentam até hoje a saída do jogador, por sua liderança e dedicação, mas reconhecem que ele não foi brilhante. São os novos parâmetros. Jogador bom, agora, não é mais o que desmorona uma defesa com dribles nem o que dá passes decisivos e faz muitos gols.
As novas referências são liderança, dedicação, intensidade de jogo, velocidade, dinamismo, várias estatísticas, além de outras, que são importantes, mas se tornaram lugares-comuns e que, muitas vezes, estão distantes dos fatos atuais. As estatísticas são essenciais, desde que acompanhadas de rigor crítico e dentro de um contexto.
O São Paulo, desde antes de Muricy, não tem aproveitado bem os bons jogadores. Maicon é a bola da vez. Ele não é especial, mas é muito superior a Wesley, que faz parte do numeroso grupo de atletas razoáveis, supervalorizados por serem velozes e dinâmicos. Os técnicos adoram esse tipo de jogador, mesmo se não tiverem talento. Pior, eles ganham como craques e se sentem craques, como Wesley, no Palmeiras. Danilo é o exemplo oposto. Tem pouca velocidade, mas muita técnica e criatividade. Não é por acaso que faz tantos gols decisivos.
Hoje, veremos um jogo com muita técnica, entre Chelsea e PSG, equipes com estratégias parecidas à do Corinthians, mas com muito mais qualidade individual. Mourinho tem utilizado Fábregas como segundo volante ou como meia de ligação, saindo Oscar. Nas duas funções, Fábregas brilha e é o líder de passes para gol no Campeonato Inglês.
No clássico paulista, Muricy colocou Ganso, no segundo tempo, de segundo volante. Após a partida, lamentou que ele não tivesse dinamismo para a função e que, apesar de insistir tanto, não tenha característica nem goste, como meia ofensivo, de entrar na área e fazer gols. Essa novela já dura um ano e meio, sem sair do lugar, sem data para acabar e com a participação dos torcedores e da imprensa. Parece Malhação, da TV Globo.
Também faço parte dessa novela. Pela milésima vez, digo que, se Ganso tivesse tido outra formação, seria hoje tão bom quanto Fábregas, como meio-campista, mistura de volante e de meia. Tenho saudades de um Ganso que nunca existiu.
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