É frequente no futebol idolatrar os vencedores e massacrar os perdedores. A maioria ignora erros e deficiências de quem ganha e acertos e virtudes de quem perde.
Por causa da eficiência e da maneira agradável de jogar, das conquistas da Libertadores do ano passado e de outros títulos, Renato Gaúcho, que faz ótimo trabalho no Grêmio, passou a ser tratado como um super-herói, bajulado por tudo o que fala e faz, até quando erra.
Se o Grêmio ganhasse o bi da Libertadores, a estátua prometida pelo clube seria de ouro.
No ano passado, na final contra o Lanús, o Grêmio foi criticado por usar drones para espionar os treinos do time argentino. Renato disse que o mundo era dos espertos. Agora, o Grêmio tenta ganhar no tapetão, por causa da malandragem do técnico Gallardo, do River Plate, que, suspenso, dirigiu o time das cabines e ainda foi ao vestiário, no intervalo do jogo. Gallardo tem de ser punido.
Nas duas partidas, o Grêmio jogou à brasileira, como escreveu Juca Kfouri, na defesa e com muitos chutões. No primeiro jogo, havia a justificativa dos desfalques e de ser fora de casa. No segundo, mesmo em casa, por causa da vantagem de um gol, Renato repetiu a estratégia.
O Grêmio, fora as duas partidas contra o River Plate, é o time brasileiro que joga o futebol mais agradável. Isso começou com Roger Machado e foi aperfeiçoado com Renato Gaúcho.
Mas a principal razão é a presença de jogadores especiais no meio-campo. Sem Arthur, sem Luan nos dois jogos contra o River e com Maicon fisicamente esgotado, o Grêmio foi outro time.
O Palmeiras, com Felipão, joga sempre à brasileira, embora tenha o melhor elenco do país. Felipão tem uma grande virtude, a de fazer com que os jogadores executem bem o que foi planejado. Faltam ideias mais criativas. Muitos falam que é uma maneira simples de jogar. Acho que é primária, a mais fácil de fazer.
Funciona bem no Campeonato Brasileiro, por causa do bom e grande elenco e pela limitação dos adversários, ainda mais que Grêmio e Cruzeiro jogaram muitas partidas com os reservas.
As eliminações de Grêmio e Palmeiras não diminuem as qualidades de Renato Gaúcho e de Felipão. São bons, mas nem tanto. Uma das razões da supervalorização dos técnicos, nas derrotas e nas vitórias, é a prática habitual de analisar os jogos somente a partir dos resultados e da conduta dos treinadores. Há sempre uma ilusão nas derrotas de que faltou a pitada tática mágica do treinador.
Impressiona-me também como o mesmo técnico é endeusado e, pouco tempo depois, tão criticado, como se ele mudasse os conceitos e a maneira de trabalhar. É o caso de Aguirre no São Paulo. Já Felipão e Renato são exceções. São elogiados, bajulados, mesmo nas derrotas.
A cobertura diária dos grandes clubes, ainda mais quando os técnicos têm muito prestígio, como Renato e Felipão, se parece com a da Seleção, com Tite, antes e durante a Copa. A badalação ao técnico era enorme. O tratamento era dócil e otimista. Jornalistas não deveriam criticar quando não há motivo, mas não deveriam também ser tão bonzinhos. Foi a cobertura da não notícia. Parecia assessoria de imprensa.
Todos que trabalham no futebol precisam evoluir. Tento fazer isso, me reinventar, mas tenho dificuldades de me desvencilhar de alguns vícios e repetições. Assim como há várias maneiras de ganhar e de perder, existem formas diferentes de pensar e de ver o futebol.
Tostão
Cronista esportivo, participou como jogador das Copas de 1966 e 1970. É formado em medicina.
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