Tostão

Cronista esportivo, participou como jogador das Copas de 1966 e 1970. É formado em medicina.

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Descrição de chapéu 50 Anos do Tri

Quis ser mais realista que a realidade e corri risco de perder a Copa de 70

Dias antes da lista final, disse que entenderia se decidissem pela minha dispensa

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No último dia 14, a Folha noticiou, em seu acervo diário de 50 anos atrás: “Tostão sente irritação no olho e deixa treino da seleção”.

Dr. Roberto Abdala Moura, que tinha operado meu olho esquerdo em setembro de 1969, foi, a pedido da comissão técnica, de Houston, nos Estados Unidos, a Guanajuato, no México, onde se concentrava o time brasileiro. Ele me examinou, falou que o problema era externo, uma conjuntivite, que, aos poucos, desapareceria a vermelhidão no olho e que eu poderia treinar e jogar o Mundial.

Convidado pela CBD, Dr. Roberto chegava às vésperas onde estávamos concentrados, me examinava, conversávamos, assistia às partidas da seleção e voltava aos Estados Unidos.

Apesar da afirmação contundente do médico, notei uma preocupação, compreensiva, da comissão técnica. Dias antes da divulgação da lista final dos que jogariam a Copa, disse a eles que eu estava pronto para jogar, mas que entenderia se decidissem pela minha dispensa. Eles me falaram que confiavam nas palavras do médico e que eu estaria no Mundial. Devia ter ficado calado. Quis ser mais realista que a realidade, mais honesto que a honestidade e corri o risco de ser cortado.

No dia 17 de maio de 1970, o Brasil fez um jogo amistoso contra o Deportivo León, do México. Ganhamos por 5 a 2, dois gols de Pelé, um de Rivellino, um de Paulo Cézar Caju e um meu. Até aquele momento, Zagallo tinha dúvida sobre quem seria o titular na Copa.

Fui escolhido para o amistoso. Antes da partida, o técnico me disse que queria que eu jogasse à frente de Jairzinho e Pelé, sem ter de voltar para receber a bola, diferentemente do fiz no Cruzeiro e nas Eliminatórias, com João Saldanha. Disse a Zagallo: “Não há problema. Vou jogar como Evaldo, do Cruzeiro”.

No último dia 18, a Folha deu em seu acervo: “Apesar de errar muito, a seleção brasileira goleou o time mexicano”. Minha lembrança da partida, que não é muito confiável para um idoso de 73 anos, é diferente. Quando terminamos o jogo, saímos conversando, alegres, trocando palavras, como se todos dissessem: “Esse é o time”. Zagallo, na entrada do vestiário, estava com um largo sorriso de aprovação. Eu estava escalado para a estreia na Copa.

Eu tinha consciência de que uma equipe com dois atacantes extraordinários, agressivos e artilheiros, como Pelé e Jairzinho, precisaria de um centroavante facilitador, que se movimentasse, abrisse espaços e tocasse a bola de primeira. Sabia que seria um coadjuvante, um centroavante de poucos lances individuais, diferentemente do que eu era no Cruzeiro.

Após essa viagem por 50 anos, volto à atual realidade. Nunca imaginaria ver uma tragédia tão assustadora. Continuo de pé, com esperança e sonhos.

No fim de semana, vi o retorno do futebol na Alemanha, sem público e repleto de novas regras. Foi melhor do que eu pensava. Como era esperado, a Alemanha, pelo estilo coletivo, de poucos dribles, de muita troca de passes, geralmente em dois toques, talvez seja o país em melhores condições de se adaptar ao novo jogo.

Evidentemente, em todos os países, sem exceção, o futebol, sem público, nunca será o mesmo. Parece um treino coletivo com muita seriedade. Parafraseando Tom Jobim, em uma de suas belíssimas músicas, “Inútil Paisagem", de que serve um jogo de futebol sem os aplausos, as vaias, os cantos e o ruído das torcidas?

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