O título sem dúvida era positivo: "66% dos leitores aprovam cobertura sobre o futuro governo Bolsonaro". O texto ainda contava que só 11% consideraram o trabalho do jornal ruim ou péssimo. Nada mau, mas a melhor notícia da pesquisa Datafolha publicada nesta quarta (21) veio como resposta a uma pergunta que não foi feita. Explico.
A Folha tem entre seus princípios a prática de um jornalismo pluralista e apartidário, traduzido na divulgação de amplo espectro de opiniões e variedade de ângulos a respeito de um mesmo fato e na atuação desatrelada de governos, oposições, partidos e doutrinas.
Talvez seja impossível confirmar o pleno atendimento dessas diretrizes, pois sempre se poderá argumentar que um determinado ponto de vista foi ignorado, que uma faceta da realidade deixou de ser iluminada, que certa reportagem alinhou-se aos interesses do partido X ou que tal colunista funciona como porta-voz de sabe-se lá quais interesses.
Ainda assim, alguns indícios podem sugerir que a Folha está mais perto ou mais distante de cumprir seus objetivos. Por exemplo, se a imensa maioria dos leitores entrevistados pelo Datafolha considerasse que o jornal somente ecoa propostas de uma legenda política em particular, certamente algo de errado estaria sendo feito.
Deu-se algo diferente, contudo. Entre os entrevistados, 14% situam a Folha na esquerda e 24% na centro-esquerda; 25% a posicionam no centro; 21% a colocam na centro-direita e 12% na direita.
Há, evidentemente, uma incompatibilidade entre esses cinco grupos de leitores. Admita-se que, existindo proximidade razoável entre esquerda e centro-esquerda, assim como entre direita e centro-direita, a distinção nesses casos se dilui.
Mas como defender que a Folha possa ser de esquerda e de direita ao mesmo tempo? Quem está errado, o leitor que vê o jornal num canto ou o que o enxerga no polo oposto? Nada mau para uma publicação que se pretende pluralista e apartidária.
Comentários
Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.