O agronegócio de 2022 vai provocar uma dicotomia entre o Sul e as demais regiões do país. A safra de verão de 2021/22 foi caracterizada por pesados aumentos de custos para todos, mas as receitas vão estar localizadas em poucas regiões.
A intensa quebra na produção agropecuária do Sul voltou a elevar os preços das commodities, que já vinham em alta desde o ano passado.
Quem produzir bem vai se beneficiar dessa elevação. Para os demais, a conta não fecha. O estrago financeiro será maior na região Sul, constituída por propriedades menores de terra. Já o Centro-Oeste, que concentra grandes produtores, terá receitas melhores neste ano.
Soja e milho praticamente dominam as culturas no Sul, e elas estiveram entre as mais afetadas nesta safra de verão.
A região Sul teve uma quebra de 23% na produtividade de milho, segundo dados da Conab (Companhia Nacional de Abastecimento). A redução foi de 34% no Rio Grande do Sul e de 24% no Paraná.
Já as regiões do Centro-Oeste e Nordeste, com menor importância na produção do cereal nesta primeira safra, obtiveram aumentos de 7% e de 9%, respectivamente.
O cenário para a soja não é muito diferente. Pelas contas da Conab, o Sul deverá ter uma queda de 42% na produtividade da safra atual, enquanto as demais regiões praticamente mantêm o volume da anterior.
Os produtores do Paraná vão obter apenas 2.065 kg por hectare, o menor volume dos últimos 30 anos; e os gaúchos, 1.767 kg, o menor em dez anos. Já os produtores de Mato Grosso vão conseguir produtividade recorde de 3.592 kg, informa a Conab.
A seca muda a configuração das receitas neste ano, que vão para Mato Grosso. Em 2020, os mato-grossenses detinham 16% do VBP (Valor Bruto da Produção) nacional —volume produzido dentro da porteira, multiplicado pelo preço dos produtos.
Neste ano, tendo em vista o resultado desastrado da primeira safra no Sul, Mato Grosso deverá ficar com 18% das receitas agropecuárias do país. A estimativa é que o VBP atinja R$ 1,21 trilhão, conforme dados divulgados pelo Ministério da Agricultura nesta segunda-feira (14).
São Paulo e Minas Gerais também têm participação maior, mas os grandes perdedores são Paraná e Rio Grande do Sul.
No ano passado, os paranaenses detinham 14% do VBP nacional; e os gaúchos, 10,5%. Neste ano, serão 11% e 8%, respectivamente. O total da região cai para 23%, após ter atingido 29% em 2021.
"É um ranking fora da curva e faz parte do jogo", diz Antônio da Luz, economista-chefe da Farsul (Federação da Agricultura o Estado do Rio Grande do Sul). Assim como aconteceu nos estados do Sul neste ano, a seca poderá ocorrer nos do Centro-Oeste em outro, afirma.
As perdas, no entanto, são de grande relevância para a economia da região. O importante agora é ter uma agenda consistente na busca de soluções e na tomada de decisões. Não é só o campo que vai perder. Dos 67 segmentos da economia, conforme dados do IBGE, 63 são impactados pelo crescimento ou pela queda da agropecuária, segundo Luz.
A economia é circular. As máquinas, antes de chegar ao campo, saem das indústrias, passam por revendas e exigem uma área de serviços. A agroindústria envolve tradings, cooperativas e agrosserviços.
Para cada R$ 1 que a agropecuária deixa de arrecadar, R$ 3,2 deixam de circular nas indústrias, no setor de serviços e em pagamentos de impostos. Essa deverá ser a seca com os maiores efeitos sobre a economia gaúcha, calcula o economista da Farsul.
A projeção de um PIB (Produto Interno Bruto) positivo em 0,58% para este ano se converteu em uma perspectiva de queda de 8% no estado, afirma ele.
A queda na safra tem um efeito cascata sobre a economia. Menos grão significa menos caminhões circulando e uma atividade menor nas armazenadoras, nas processadoras de grãos, nos postos de gasolina e no setor de serviços.
O campo e a cidade se complementam. As indústrias utilizam muita mão de obra na produção, enquanto a agricultura produz com alta tecnologia e emprego de capital, afirma Luz.
Dados do Cepea (Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada) mostram que os preços do milho superaram R$ 100 por saca, e os da soja estão acima de R$ 200.
Além da seca, a demanda externa e a guerra da Rússia com a Ucrânia impulsionam a alta.
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