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Pablo Ortellado é professor do curso de gestão de políticas públicas da USP e doutor em filosofia; Leandro Narloch é jornalista, autor de “Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil” e mestre em filosofia pela Universidade de Londres

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Descrição de chapéu Eleições 2018

O presidente deve combater diferença salarial entre gêneros?

Colunistas Pablo Ortellado e Leandro Narloch debatem

Disparidades podem ser enfrentadas

Pablo Ortellado

Diversos estudos têm constatado a disparidade salarial entre homens e mulheres no Brasil, cuja razão está por volta de 75%. Para cada R$ 1 que o homem recebe, a mulher recebe, em média, R$ 0,75. 

Os estudos apontam uma série de razões para a disparidade, entre as quais se destacam o fato de as mulheres interromperem as carreiras ou adotarem regimes de tempo parcial para cuidar dos filhos, o perfil das ocupações escolhidas pelas mulheres ser pior remunerado que as escolhidas pelos homens, além da discriminação pura e simples, quando funções iguais remuneram de maneira diferente homens e mulheres.

Em entrevista ao Jornal Nacional e depois em debate com Marina Silva, Jair Bolsonaro afirmou que a igualdade salarial já está prevista na CLT e que não é preciso nenhuma medida adicional além da legislação em vigor. 

No passado, Bolsonaro chegou a afirmar que “não empregaria [homens e mulheres] com o mesmo salário”.

Embora o tema tenha entrado no debate eleitoral principalmente pela chave negativa, por meio da controvérsia, há uma série de políticas que podem ser implementadas e que têm sido testadas na experiência internacional.


Os estudos sugerem que a disparidade salarial é sobretudo resultado da distribuição desigual do trabalho doméstico e do cuidado dos filhos, além, propriamente, da remuneração desigual para uma mesma função. 

Entre as medidas que têm sido experimentadas, destacam-se a ampliação da licença paternidade, que estimula a divisão mais equitativa do cuidado dos filhos; a inversão do ônus da prova em demandas judiciais sobre pagamento desigual para a mesma função; e a publicidade dos salários dos funcionários de grandes empresas, que permite que em negociações salariais e em promoções, as mulheres disponham de parâmetros para exigir pagamento igual.

Empurrados pela polêmica com Jair Bolsonaro, Marina Silva, Geraldo Alckmin e Fernando Haddad anunciaram que estudam medidas para reduzir as disparidades, mas elas ainda não foram apresentadas. Referências internacionais não faltam.

O governo se meter é um tiro no pé

Leandro Narloch

 Pouca gente sabe, mas os deputados já aprovaram, em 2011, uma lei de equiparação salarial. Dilma Rousseff planejava aprovar o projeto no Senado e sancioná-lo no 8 do março de 2012, mas desistiu. Temia-se que a lei resultasse “na redução de vagas para mulheres no mercado de trabalho”, segundo O Estado de S. Paulo.

Eis uma rara atitude sensata do governo Dilma. O projeto não distinguia funcionários com mais experiência ou tempo de serviço, por isso aumentaria a confusão jurídica e o medo de se contratar mulheres. Está até hoje parado no Senado. O governo não deve combater diferenças salariais porque essa atitude, como boa parte das políticas públicas, seria um remédio que piora a doença. Mas será que os indivíduos e grupos organizados deveriam entrar nesse combate?

Depende da estatística e da causa. O número do IBGE, segundo o qual as mulheres ganham 22,5% menos, não trata de salários no mesmo cargo: é uma média da remuneração de todos os homens e mulheres do país, sem considerar carga horária, profissão, idade e experiência.

Para igualar esse número, seria preciso proibir algumas escolhas femininas. Claudia Goldin, economista de Harvard, explica que quando as mulheres entraram no mercado de trabalho aumentaram a oferta de mão de obra em áreas que costumam preferir, como educação. Por oferta e procura, o salário dessas áreas baixou. E, por mais que feministas reclamem, pesquisas mostram que as mulheres simplesmente não se importam tanto quanto os homens em chegar ao topo da carreira. Preferem cargos menos tensos e com mais tempo livre. Deveríamos proibir essas preferências em nome da estatística?  

Economistas desconfiam da desigualdade salarial para o mesmo cargo porque, se as mulheres ganhassem 22,5% menos para o mesmo trabalho, as empresas só contratariam mulheres.
Ainda assim, quando se iguala a idade, formação, experiência, as mulheres continuam ganhando entre 5% a 7% menos.

Parte dessa diferença residual certamente se explica pelo machismo, e talvez por uma tendência feminina em ter mais medo de pedir aumento. Nesses dois casos, sim, ações de grupos feministas poderiam ajudar a alertar empresas contra preconceitos, e mulheres quanto a tendências evolutivas de comportamento.
 

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