Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Vinicius Torres Freire

As emoções do drama político de Lula

Apoio ao PT foi minguante nas ruas desde o impeachment; prisão de Lula causará indiferença?

 
Lula acena a apoiadores na janela do sindicato dos metalúrgicos do ABC
Lula acena a apoiadores na janela do sindicato dos metalúrgicos do ABC - Avener Prado/Folhapress

LULA ESTAVA para ser preso em março de 2016, dias antes de ser nomeado ministro-chefe da Casa Civil de Dilma Rousseff. Não foi preso, não foi ministro e, um tantinho por causa da convulsão daqueles dias, Dilma não seria mais presidente. A emoção do tumulto, que chegou às ruas, foi o impulso final da campanha do impeachment.

Lula pode estar na cadeia no fim da tarde desta sexta-feira (6). E daí? Dar palpites sobre o futuro próximo da política e das eleições torna-se agora especulação ainda mais arriscada, pois o impacto da notícia turva a clareza da análise e, enfim, é incerto o efeito do encarceramento do ex-presidente nas emoções do povo.

A prisão de Lula agora parecia mais previsível, embora restasse alguma chance remota de reviravolta ou de jeitinhos no processo. Sergio Moro, muito à sua maneira, outra vez promoveu uma peripécia dramática.

Como se recorda, Lula foi nomeado ministro de Dilma no início da tarde da quarta-feira, 16 de março de 2016 —momentos antes, uma conversa dos dois fora grampeada. A oposição dizia que iria à Justiça contra a nomeação, tida como um mero pretexto, “desvio de finalidade”, para salvar Lula da prisão.

No fim da tarde, Moro divulgou o grampo da conversa entre os dois agora ex-presidentes. Logo em seguida, no começo da noite, haveria multidões nas ruas de várias cidades, todas pedindo a cabeça de Dilma e Lula em meio a buzinaços, fogos e panelaços.

Na avenida Paulista, em São Paulo, as luzes que cobriam a fachada do prédio da Fiesp de listras verdes e amarelas eram atravessadas por uma faixa preta diagonal: “Renúncia Já”.

Perto dali, no Museu de Arte de São Paulo, o Masp, era inflado um boneco gigante da caricatura de Lula presidiário, o Pixuleco. A PM disse então que a manifestação juntara 5.000 pessoas. Seriam 70 mil, segundo os líderes das manifestações, cabeças dos mesmos grupos que nesta semana pediam nas ruas a prisão de Lula.

Dias depois, a atitude de Moro seria considerada ilegal por Teori Zavascki, ministro do Supremo responsável pela Lava Jato, morto em acidente de avião em janeiro do ano passado. O grampo seria retirado do processo, mas o mecanismo político-legal-ilegal já provocara a explosão emocional de revolta. No dia 17 de abril, a Câmara abriria o processo de impeachment.

Haveria manifestações de apoio a Dilma, decerto. Mas o apoio aos líderes do PT foi minguante. A ex-presidente acabou caindo sem muito estardalhaço nas ruas. As reações contra os processos de Lula foram ainda menores, quase restritas à militância mais organizada e fiel, cada vez menor. Pelo menos até as 21h desta quinta-feira (5), quando são escritas estas linhas, mal se notava comoção popular diante do risco da prisão do ex-presidente mais popular da história do país, nem mesmo depois da ordem de Sergio Moro.

Parece um sintoma, mais um entre tantos, da progressiva desconexão do PT com movimentos populares organizados, apesar do prestígio restante de Lula, que lhe dá um terço dos votos da eleição para presidente, muitos deles de cidadãos muito pobres de rincões do país.

As emoções vão mudar? Depois do impacto inicial, as indignações restantes vão arrefecer até a quase indiferença?

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