Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Vinicius Torres Freire

OS DONOS do dinheiro grosso se deram conta de que, mesmo com Lula caçado e preso, o “centro” ainda não teria um candidato forte para eleição de 2018. Correu por aí essa explicação para os pulinhos do dólar, que passou de R$ 3,40, para o tombinho da Bolsa etc.

Essas conversas fiadas sobre idas e vindas do mercado são em geral inverificáveis, até porque no curto prazo faltam dados mais precisos de quem vendeu ou comprou o quê e em quais quantidades, para começar. Além do mais, alguma coisa acontecia no mercado brasileiro desde março.

Desde então, houve mudanças de tendências nos preços, as quais também discrepam do comportamento das variações em mercados mais ou menos primos do nosso (emergentes, países maiores da região ou que dependem de commodities etc.).

O dólar começou a ficar mais caro em meados de março. Na mesma época em que a Bovespa descia do pico de 87 mil pontos, do fim de fevereiro, para a casa dos 84-85 mil pontos. Desde a prisão de Lula, desceu apenas outro degrau, para a casa dos 83 mil pontos.

Os juros de prazo mais longo começaram a dar uma subidinha no fim de março. Nada dramático. Mas, agora, parece claro que algum vento parece ter deslocado a biruta do mercado desde o mês passado.
O que pode ter acontecido?

O enterro da reforma da Previdência aconteceu em 16 de fevereiro. No dia 21 de março, o Banco Central causou uma surpresinha, abrindo a porta para baixa adicional da Selic (juro de curtíssimo prazo). Na semana seguinte, os amigos de Michel Temer eram presos e, para efeitos reformistas, o governo morreu de vez.

Na semana passada, antes do tumulto do STF e da prisão de Lula, o Congresso derrubara vetos de Temer, alguns deles com a cumplicidade de um governo enfraquecido, entre outros favores que aumentaram o rombo fiscal deste ano e de 2019.

Juros (Selic) mais baixos barateiam especulações (ou o “hedge”), com dólar inclusive. A vaca leiteira da Bovespa parecia ter dado tudo o que podia, sendo difícil que rendesse mais durante a campanha eleitoral mais incerta em quase 30 anos.

O governo Temer virou bagaço. Já estava quase seco desde a temporada de escândalos do ano passado. Com o fim da reforma da Previdência, a prisão de quase todos os homens do presidente e a campanha eleitoral, ficaremos no lucro se a equipe econômica conseguir evitar avanços do Planalto e do governismo sobre o Tesouro —um risco. A política econômica será o feijão com arroz, como se dizia, aliás, no fim do governo Sarney, outro desastre da República.

O país está um tumulto, dominado em geral por gente indizível, com um governo inerte e outro, o de 2019, do qual não se tem ideia do que será. Juros (Selic) menores dão uma forcinha para o dólar, embora esse efeito quase nunca seja líquido e certo no curto prazo.

O resumo da ópera é que o Brasil entrou no limbo eleitoral, está em suspenso, sem futuro à vista, sob risco de convulsões mais frequentes, com uma recuperação econômica medíocre. O caldinho parece ter entornado em março, com o povo do dinheiro grosso ficando mais prudente.

Pode não ser a explicação, mas parece um conjunto discreto de fatores que influenciaram algumas retiradas do mercado.

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