Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

Salvar artigos

Recurso exclusivo para assinantes

assine ou faça login

Vinicius Torres Freire

Brasil leva goleada nos juros

Taxas de juros no atacadão de dinheiro voltam a níveis do pânico da semana passada

O pânico da semana passada nos mercados financeiros se transformou em fervura constante. O termômetro mais pop desse tumulto, o preço do dólar, parecia indicar que a febre baixava.

A moeda americana, que foi a quase R$ 3,97 no meio da confusão, voltara à casa dos R$ 3,70. Era o efeito do antitérmico das intervenções do Banco Central no câmbio.

Nos juros, o mal-estar continuava. Nesta quinta-feira (14), houve calafrios, taxas superando os níveis dos dias de crise da quinta-feira passada (7). Trata-se aqui dos negócios no atacadão dos mercados de dinheiro.

- AFP

O custo de financiar investimentos e a dívida do governo está subindo, ao que parece de modo duradouro, não se sabe bem para qual patamar. Para uma economia que mal e lentamente se recuperava da recessão, é um choque.

A gente ouve por aí um saudosismo dos resultados da economia em abril, antes do caminhonaço, números que pareciam até bons, dada a lerdeza do primeiro trimestre. Mas não era grande coisa, mesmo antes da batida de caminhão de maio.

A massa dos rendimentos do trabalho desacelerava desde fins de 2017, por exemplo, péssimo sinal, dado que essa recuperação dependia basicamente de consumo das famílias.

O choque de confiança e as perdas diretas provocados pelo paradão caminhoneiro serão tanto mais agravados quanto mais tempo durar a fervura dos juros, tudo envenenado pela alta agora relevante do dólar.

Em suma, os donos do dinheiro não aceitam financiar governo ou nada mais pelas taxas pré-caminhonaço. O que está em discussão é o preço. Grosso modo, enquanto segue a queda de braço, se livram de certos títulos da dívida pública, apostam em dólar.

No caso do câmbio, é jogo pesado mesmo. A munição extra que o Banco Central prometeu usar nesta semana praticamente se esgotou (swaps cambiais, operações financeiras equivalentes à venda de US$ 20 bilhões; US$ 18 bilhões já se foram). O dólar foi a R$ 3,81, em parte vitaminado por tumultos no mercado lá fora.

Pode-se fazer um bom dinheiro apostando contra o Banco Central, em alta adicional do dólar, especulando que a autoridade monetária em algum momento vai intervir menos no câmbio. Afinal, o BC preciso guardar bala para as turbulências que a eleição deve provocar.

Há quem chute que o paniquito renovado tenha se devido apenas à falta de sinais sobre novas intervenções. Pelo sim ou pelo não, no fim desta quinta-feira o Banco Central disse que terá mais US$ 10 bilhões para atirar, na semana que vem.

Disse ainda que tem mais bala na caixinha: que o volume de operações de swap dos tempos terminais de Dilma Rousseff não é um limite (as operações de swap estão em US$ 56 bilhões; em 2015, chegaram a US$ 115 bilhões).

Resumo da ópera, as taxas de juros voltaram aos níveis mais altos dos dias do pânico da semana passada. A taxa de juro real "básica" no mercado chegou a perto de 3,4% ao ano (estava em 2,30% antes de o Banco Central decidir manter a Selic, em 17 de maio). Se ficar por aí, é como se tivéssemos regredido a agosto do ano passado.

Povos do mercado querem que o Banco Central chancele a alta de juros na praça, querem aumento da Selic na semana que vem e nos próximos meses. Em tese, se as expectativas de inflação continuarem no cabresto (e por ora não há motivo maior para que não estejam), não faz sentido elevar a Selic. Mas querer sentido não é uma atitude sensata nestes tempos.

vinicius.torres@grupofolha.com.br

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.