Vinicius Torres Freire

Jornalista, foi secretário de Redação da Folha. É mestre em administração pública pela Universidade Harvard (EUA).

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Vinicius Torres Freire

Brasil sem remédio para depressão

Campanha eleitoral jogou para escanteio notícias sobre o crescimento quase nenhum da economia

Esta campanha eleitoral desvairada jogou para escanteio notícias e discussões sobre o crescimento quase nenhum da economia. Ainda em março, a previsão era de aumento de quase 3% do PIB em 2018. Agora, estima-se alta de 1%, se tanto, igual ou menor que a do ano passado.

O que causou tal revertério? Comecemos pelas explicações ou pelas desculpas mais recentes.

Há aquela conversa velha sobre "incerteza eleitoral" e "falta de reformas". Têm efeito, claro. Mas eram problemas sabidos no início do ano.

Houve o desastre do caminhonaço de maio, com estilhaços que se espalham ainda agora, parada que não apenas talhou momentaneamente produção e comércio, mas também teve impacto na confiança econômica.

A partir de abril, começou um aperto nas condições financeiras, é verdade, com alta mais pronunciada do dólar e das taxas de juros "básicas" do mercado. Mas havia cheiro de queimado antes disso. Viu-se o fogo lá por maio, quando eram publicados os indicadores econômicos do fim do primeiro trimestre.

O que acontecia? Problemas com emprego e salário, com crédito bancário e retração extra do investimento público "em obras". A precarização do trabalho continuava, a taxa de desemprego estagnara no alto desde fins de 2017 e os salários passaram a crescer mais devagar. O total dos rendimentos do trabalho, vulgo massa salarial, crescia a 3,5% ao ano em dezembro de 2017. O ritmo passou a diminuir desde então, até os 2% ao ano de julho (dado mais recente).

O comércio fraquejara no trimestre final de 2017 e no inicial de 2018. A indústria resistiu até o caminhonaço. O setor de serviços continuou a despiorar, mas ainda nem saiu da recessão, que começou em meados de 2015, apenas encolhendo menos.

As taxas de juros nos bancos voltaram a subir no primeiro trimestre deste ano, embora para um nível próximo daquele do início de 2012 (ano medíocre, mas no azul). O crédito novo para empresas ainda caía no início deste 2018; saindo do fundo do poço, havia alguma recuperação nos empréstimos para pessoas físicas. A partir de abril, o custo do dinheiro nos bancos cairia, mas apenas voltando ao nível do final do ano passado.

Vários impulsos do que parecia uma retomada se esgotaram em 2017. O aumento da massa de salários deveu-se em boa parte à queda muito rápida da inflação no ano passado. Consumo e ânimos tiveram ainda o gás volátil do saque das contas inativas do FGTS, consideráveis R$ 45 bilhões. Em 2018 não houve também a extraordinária safra agrícola de 2017.

Há vários motores fundidos na economia brasileira, claro. Os estragos desta década produziram um desastre de raridade secular. Ainda assim, parecia haver estímulo monetário (juros algo mais baixos) para ao menos uma corridinha de passo curto do PIB. Mas a economia permaneceu deprimida.

Faltou o impulso adicional do investimento, público ou de concessões. Faltou ar no mercado de trabalho. Sobra medo.

O trabalho novo que apareceu é precário e paga pouco; quem está mais bem empregado vê o massacre em torno e tem medo de perder a cabeça também. O peso da dívida na renda das famílias até diminuiu, mas parece que o povo, alquebrado pelo grande endividamento seguido do grande tombo recessivo, também teme fazer nova dívida.

Sim, houve o aperto financeiro recente e o caminhonaço. Mas foram rasteiras em uma criatura já desequilibrada. Assim seguimos para fechar 2018 ainda 8% mais pobres do que éramos em 2013.

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